ela me diz “não poderá passar impune” quando eu digo
“a distância infernalmente tranquila entre nós”
e respondo com um conto, respondo improvisando à noite ao piano,
entre paredes nuas, intervalos harmônicos soturnos
iluminados esparsamente pelas luzes da rua
a fumaça sobe do cinzeiro pousado ao lado, vodca,
no improviso eu digo “me beija, e nada terá passado impune”.
mas o beijo se perderá na distância infernal,
a tranquilidade forçada dos dias se manterá
nossas vidas assombradas por desejos
(estes, muito próximos, e me acordam à noite)
passaremos outra tarde esperando a noite depois daquela
dando vida às Musas com nossas paixões
exceto que Musas não beijam;
escritores, músicos, podem fazer surgir dos dedos
desejo universo dos infinitos caminhos
(ficcional é aquilo que bifurca os percursos do real)
mas escritores, frente à telateclado
ao final do último ponto se deparam
com a mesma distância infernalmente
vazia.