Michael Jackson: Is THAT it ??
d.C. 2009/2
Carlos Irineu da Costa

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no outro artigo sobre Michael Jackson, acabei escrevendo mais sobre o artista, fazendo um breve resumo de sua trajetória no mundo pop com alguns comentários.

queria falar agora do filme / documentário-de-ocasião “This is it”, que preferia traduzir como: “Sério, é SÓ isso?”.

tecnicamente, não há nada a reclamar, tirando o detalhe técnico que o ‘sentido de ser’ da montagem de sobras de filmagem de ensaios é ganhar dinheiro com a última coisa que sobrou de Jackson. o Círculo Formalista da Pizza classificaria a narrativa na categoria “roteiro? pra que isso?”.

a edição fez milagres para juntar trechos de diferentes ensaios com um mínimo de rupturas e o diretor fez mágica para criar um ‘documentário’ onde conseguiu apagar ao máximo todas as tensões e problemas dos ensaios de onde vem os vídeos, além de fazer Michael soar … minimamente ‘humano’, não sei o que dizer.

a produção do show foi / teria sido impressionante, o trabalho da equipe é sensacional e eu fiquei sinceramente emocionado com o empenho dos dançarinos, perfeitos, sempre dando o melhor de si para que a mágica do palco pudesse acontecer. quando se trata de preparar um show, o profissionalismo e perfeccionismo dos americanos é algo que, felizmente, os militares por lá não conseguem copiar nem de longe.

tenho que elogiar também a paciência dos músicos que, além de conseguirem alterar programações de teclados, de seqüenciadores, mudar sutilezas de arranjo ou recomeçar exatamente do ponto que “
eM-Jay” queria. MJ é detalhista para além do que parecia compreender (os vídeos mostram isso, os puxassako dizem o contrário - eu também diria se estivessem me pagando muito para uma ultra turnê mundial) e pedindo o tempo todo que “soassem exatamente como no disco”. por que ele não refez as bases dos discos em computador e disparou os trechos em tempo real, com uma trivial remixagem para o show?

MJ deve ter tido muito de seus comentários editados (para melhor) e, ainda assim, soa como um megachato. não um perfeccionista chato, só um esquisitão chato. mas os músicos davam conta de tudo o que ele queria.

juntando músicos, dançarinos, profissionais de iluminação, de efeitos, a produção de vídeos adicionais que seriam exibidos durante o show e, claro, os backing vocals, o que tornou o filme realmente constrangedor é que todo mundo ali estava bem preparado, disposto, animado, empenhado e com mais controle do que Mr. This is It, eMJay, Michael, so long, bye bye.

Michael  não estava bem e não quero chutar se ele estava ou não usando drogas… não importa. posso falar do que vi na tela e do que ouvi. vi um ex-negro ex-dançarino que inventou todo um ‘vocabulário’ de gestos e movimentos que foi depois copiado por centenas de artistas e reproduzido em tantos clipes, shows e mesmo passagens dos recentes musicais teen da Disney. vi alguém cujo rosto só pareceria ‘humano’ para um cirurgião plástico. quando o videocumentário foi gravado, não tinha mais presença de palco, não era mais capaz de dançar. parecia fraco demais para isso.

as mãos se moviam sem controle, sem ritmo, desproporcionais para o corpo raquítico - não deve existir cirurgia para reduzir o tamanho e formato dos ossos das mãos. ele não sabia o que fazer com aquele corpo normal em seu corpo estranho.

vi o cantor impressionante que gravou “Beat It”, “Thriller” e “Bad”, entre outras, com enorme punch, sincronismo perfeito da voz com o ritmo, afinadas notas afiadas - mas que já não era mais capaz de acertar o tempo, nem as notas, não tinha mais cordas vocais, perdeu o timbre, perdeu o punch.

documentaram a morte de um cantor antes que morresse de fato.

foi triste, foi lastimável. foi quase inacreditável ver e ouvir a sucessão de desculpas que ele ia dando para não cantar cada trecho, não terminar as frases, não acertar passagens. doloroso ver alguém tão brilhante acabar desta forma.

acho a vida de Michael Jackson foi trágica, no sentido ‘grego’ de tragicidade. discordo dessa necessidade sanguessuga de superexpor personalidades como “MJ”, queimá-los nas fogueiras da mídia. se ele ainda conservasse alguma auto-crítica, talvez não tivesse deixado as coisas chegarem onde chegaram, talvez ainda estivesse vivo, talvez tivesse mantido uma vida-carreira menos egomaníaca e seguido em frente com o que tinha de brilhante em seu início, com o potencial que ainda possuía, mas nunca trouxe ao mundo.

os fãs que me perdoem, mas, frankensteinizado ao extremo, teria sido um favor ao mundo se este documentário nunca tivesse sido lançado.

constrangedor, já disse, mas talvez deva ser visto para compreender melhor o final da carreira de um dos maiores nomes da música pop do final do século 20.

Carlos Irineu

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