Não falo muito sobre livros no site. É curioso, considerando-se que sou formado em literatura, tenho um mestrado em literatura e trabalho sobretudo como tradutor, mas também sou escritor e, algumas vezes, editor. Talvez eu leve o assunto a sério demais ou talvez eu ache que, como já trabalho com livros, falar sobre eles seria apenas mais trabalho.
Livros, contudo, são uma grande paixão – e por isso trabalho com eles.
Na última semana, li dois livros: “The Big Sleep” (Raymond Chandler, 1939) e “Do Androids Dream of Electric Sheep” (Philip K. Dick, 1968). Fora isso, estou relendo poesias do Bukowski (“The Days Run Away Like Wild Horses”), começando o novo livro do Albert-Laszlo Barabasi (“Bursts: The Hidden Pattern Behind Everything We Do”) e, como um editor está sondando se eu quero traduzir um autor que eu amo, mas cujo último livro que eu traduzi foi um pequeno parto, também estou lendo este livro (não posso dizer qual é) para ver o que acho da idéia de traduzi-lo.
O que os quatro livros têm em comum? Li ou estou lendo todos no Kindle DX, mesmo tendo versões impressas de 2 deles. O Kindle anda ‘carregado’ também com os capítulos do meu próprio romance, em estágios diversos de edição, coisas que preciso ler por questões acadêmicas e outros livros que quero começar a ler em seguida. Seria o suficiente para deixar uma mochila bem pesada.
Eu comprei de novo os 2 livros que já tinha em papel para poder ler no Kindle. Por que? Porque é mais fácil, porque ficam todos em um só lugar, porque não ocupam espaço, porque posso ler deitado na cama sem todos os inconvenientes de um livro físico [1]. Quando o iPad chegar, posso até desligar a luz de cabeceira que, por vezes, incomoda minha esposa e ler em baixo contraste, no escuro.
Só pela enorme facilidade que isso tudo representa, eu já ficaria feliz em aposentar quase todos meus livros físicos, substituindo-os aos poucos pelas versões eletrônicas.
Não tem como eu dizer o quão importante é, para mim, saber que não tenho mais que lidar com “papel”. Papel mofa (e sou alérgico, infelizmente, porque adoro livros antigos – não velhos, mas antigos!), papel envelhece (minhas edições de bolso americanas ou francesas de muitos livros estão em estado deplorável) e, pior que tudo isso, para quem tem muitos livros, papel ocupa um espaço insano.
Além disso, minhas estantes, onde só há livros, ocupam, hoje, 22m lineares. ‘Engordei’ quase 5m lineares durante o mestrado e suponho que, durante o doutorado, entrem uns 10m adicionais. Se eu for contar minha coleção de quadrinhos, a metragem aumenta mais um pouco.
Toda vez que eu me mudo – tem sido mais frequente do que eu gostaria nos últimos 6 anos, ainda que as razões em geral tenham sido boas – tenho que encaixotar cuidadosamente todos os livros e desmontar estantes (que, hoje, já são pranchas colocadas sobre ‘espinhas’ de metal, ambas fáceis de levar e reorganizar em outras configurações de espaço) e remontar estantes e chamar um marceneiro para fazer acertos. É pesado, chato, demorado, estraga alguns livros e custa algum dinheiro.
Acho que a equação mudou, e acho que as editoras deveriam prestar atenção nisso, se não quiserem acabar como as gravadoras acabaram. “Papel” não importa mais – o conteúdo importa. O que importa é a qualidade da edição eletrônica, o preço (os preços na Amazon por vezes variam muito de uma edição para outra), a tradução (bom, sou tradutor, então leio muito em inglês e francês, um pouco menos em espanhol e em italiano; mas não leio em grego nem em latim nem em alemão nem em russo….) e o valor agregado pelo trabalho editorial. Que, por enquanto, para quase todas as edições eletrônicas que tenho, é ZERO.
Tenho muito a dizer sobre o trabalho editorial, mas, por enquanto, queria só começar a falar sobre como os e-books não são nenhuma “revolução” – por enquanto, ainda são livros muito ‘caretas’ em seu formato – e sobre o quanto a mudança de suporte será, em poucos anos, irrelevante.
[1] Os “inconvenientes”: Onde colocar o livro quando você vai dormir de fato, os marcadores de página que vivem caindo, a posição incômoda de leitura na cama, tendo que segurar as páginas que já passaram e, por outro lado, o recurso ótimo de marcar trechos interessantes dos livros clicando em um botão do Kindle. Fim da encheção de saco com os belos Post It transparentes americanos que eu uso nos livros reais mas que acabam estragando o papel.