Wall Street v2010: mais do mesmo, um pouco melhor

Antes de falar sobre o Wall Street 2010, queria falar rapidamente sobre a primeira versão deste filme do Oliver Stone. Vou chamar de “primeira versão”, mesmo, porque a versão 2010 é, conceitualmente, uma refilmagem melhorada do primeiro. Claro que o filme é diferente porque o mundo mudou e a forma de filmar mudou, mas é só isso: a trama é tão ‘colada’ na primeira que me senti vendo a mesma coisa outra vez, só que o novo filme é bem executado e dentro do cenário econômico pós 9/11, pós quebra dos mercados em 2008, pós surgimento da China como grande potência econômica mundial.
Gekko é Gekko, Bud Fox foi transformado em Jake que está apaixonado por Winnie, a filha de Gekko. Existe um “cara mal”, para dar continuidade ao motto de ‘jogo e vingança’ que já existia no primeiro filme. O romance de Jake e Winnie não me diz nada e, como a trama supostamente é baseada no conflito criado pela ganância de Gekko, uma certa soma de dinheiro, o desejo de vingança de Jake (Gekko não é ‘bom’ agora, mas também não é o alvo da vingança) e as manobras em torno disso … Bom, talvez funcionasse se Oliver Stone conseguisse construir personagens – ele não consegue – ou se o suposto conflito presente na trama tivesse algum interesse. Não acho que tenha, é tolo, é simples, é óbvio e imediato.
Assisti o primeiro Wall Street, de 1989, há cerca de uma semana, em DVD. Poderia passar à tarde na TV aberta; serve como rápida nota histórica e cultural sobre a segunda metade dos anos 80; mas, como filme, é chato. Chato a ponto de dormir ou desligar ou ir fazer qualquer outra coisa melhor.
Não é a primeira vez que me surpreendo (de forma ruim) com o quanto a estética de cinema mainstream dos anos 80 envelheceu mal para nós, nestes anos 20xx. Preciso falar disso em outro texto, contudo, porque é um assunto longo. Por enquanto, basta dizer que Wall Street v89 soa ‘poser’, como um comercial de TV ou uma tele-série barata. A fotografia tenta usar umas ‘novidades’ que, hoje, soam ridículas, a trilha sonora com synthpop dos anos 80 soa mal, mas o pior são os diálogos.
Na minha visão, Oliver Stone perdeu duas chances de fazer bons filmes comerciais, mas que poderiam ser críticos e profundos (dentro dos limites da produção mainstream de Hollywood), sobre a grande piração que são as bolsas, os mercados de capital, os bancos de investimento e os homens que vivem à sombra do dinheiro e do suposto ‘poder’ que esse dinheiro lhes traz. [1]
Do jeito que foram produzidos, os dois filmes dão uma ‘pincelada’ em assuntos importantes- capital, bolsas, a especulação substituindo a produção como valor social -, mas, mesmo quando Wall Street 2010 fala sobre o ‘crash’ das bolsas de 2008, com Gekko fazendo uma crítica ao atual modo de vida norte-americano – viver do refinanciamento de dívidas que nunca podem ser pagas -, é quase um comentário breve, um pano de fundo para validar a trama (tola) do filme. Stone não consegue passar da superfície dos fatos e não nos permite pensar muito sobre o que aconteceu.
Eu teria ficado muito feliz em ver um produtor de filmes (não é o mesmo que ‘cineasta’, não é?) dos EUA indo além do recurso barato de colocar o personagem de Gekko em uma palestra universitária pronunciando frases de efeito pseudo-profundas sobre o atual mercado de capital, o problema das dívidas, a geração NINJA (No Income, No Job, no Assets) e outras coisas que me fizeram dar um meio-sorriso rápido. Mas o filme é só isso, não vai além em nenhuma direção.
Stone também ‘percebe’ que a informação, hoje, flui muito mais rápido pela rede e que rumores sem fundamento podem destruir empresas ou criar fortunas. Coloca isso de forma visualmente agradável, graças à eficiência gráfica dos computadores atuais, mas também não leva isso ao limite, não explora o assunto.
Se alguém fizer um “Matrix Wall Street”, será um grande filme.
Para fechar, se alguém teve a pachorra de ler até aqui para saber se é para assistir o filme ou não, eu diria que sim, em grande parte porque tenho total noção de que sou mais crítico do que boa parte dos espectadores. Não ‘julgo’ essa minha crítica: pior, melhor…. tem sentido fazer tais perguntas? Não creio.
Posso afirmar, com razoável certeza, que as pessoas que se lembram com alguma simpatia do Wall Street v89 vão gostar mais do atual. E, se alguém acha que ‘precisa ver’ a versão 89, eu diria que até mesmo em DVD, podendo parar no meio, é completamente dispensável, mas, novamente, o aluguel do DVD é barato e cada um decide sobre como usar seu tempo.
[1] Cabe um outro ensaio, aqui, sobre a natureza do ‘poder’, ou as muitas miragens do que seja ‘poder’, e de como parece que temos essa necessidade embutida em nosso hardware, hipoteticamente para resolver uma questão insolúvel: nunca temos o poder de evitar nossa morte. Tentamos, contudo, comprar qualquer ilusão que nos faça pensar o contrário.
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