Como escrever [sem ser óbvio]

a primeira coisa é definir que não há regras: por exemplo, criar uma regra dizendo que não há regras e começar com isso.
pensando um pouco, você pode notar que paradoxos também funcionam bem: se eu fosse escrever uma série de artigos sobre “como escrever”, sabendo que eu não gosto de regras nem do que é óbvio, poderia tentar um paradoxo: chamar a série de “Como escrever”, e acrescentar “[sem ser óbvio]”.
os paradoxos muitas vezes são uma saída fácil e tola. gosto quando é possível usá-los com ironia, sobretudo quando é possível criar uma (suposta) auto-referencialidade ou extrapolar isso e dizer que sua (pretensa) auto-referencialidade é uma meta-referencialidade.
você fecha esta parte do assunto sem explicar mais nada, você muda completamente de tópico e, sem nunca perder de vista a escrita em si, diz:
eu estava fugindo hoje do segundo engarrafamento sucessivo quando, já tendo entrado na terceira rota alternativa, notei que estava em um canto tão estranho da cidade que a melhor definição seria dizer que, lá, o álcool (quem diabos sobrecorrigiu o nome para “etanol”?) custava quase 40 centavos a menos que em qualquer posto da cidade.
você tem idéia de quão longe está de qualquer centro quando sua melhor referência é notar que o etanol está 40 centavos mais barato? e onde fica a coragem para colocar isso motor adentro, sabendo bem o custo das peças se tiver entrado água no etanol barato?
é o que posso dizer de melhor e talvez tenha sido a coisa mais interessante que pensei hoje, embora as muitas pessoas com quem interagi (foi um dia interativo, devo dizer) possam ter achado mais relevantes os meus comentários sobre a bomba d’água de auto-sucção que atormenta o prédio (era algo assim, eu sou recém-síndico, me dêem uma chance, na praia de hidráulica sempre fiquei na areia que, ainda assim, evito por ser metáfora óbvia).
o que eu pensei em seguida? bem, se você escreve hoje sobre etanol e 40 centavos, e ninguém vai saber o preço do etanol e quão significativos esses 40 centavos são, nem em 5 anos nem em qualquer lugar fora daqui, como eu uso uma imagem que é ao mesmo tempo interessante – ela diz tudo sem ter nenhuma relação com o que expressa, de onde a força; aliás, estou quase retomando o Manifesto do Surrealismo, aqui; mas é provavelmente por isso que eu digo que toda a Arte Moderna vem do Surrealismo, sem o qual estaríamos presos ao automatismo da objetividade (oops!, nós estamos presos a twittar o automatismo da objetividade da rede) //
// como eu uso uma imagem que é ao mesmo tempo interessante mas também me parece facilmente incompreensível.
isso é um pensamento em andamento, eu só queria abrir, não fechar.
http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/sobre-a-escrita-um-divertimento.html
http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/como-escrever-um-inicio.html
http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/dada-dadaismo-no-e-gaga.html




