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Quinta-feira
jan142010

Críticas, blogs "sobre tudo" e (ainda) traduções

Há muitos Doppelgängers pelo mundo. Um Doppel que também é tradutor perdeu - sorte a dele - as idas e vindas de posts sobre a tal crítica feroz “contra” O Livro de Jobs e me mandou, no dia 14 de janeiro, um mail a respeito.

 […] [Turpilóquio.] Complexo, mas me irrita MUITO esse achismo generalizado que assola a internet e que se resume, basicamente, a pessoas dando pitaco sobre o que não entendem.

Ninguém sabe dos pepinos que temos que resolver; o nível da maioria dos textos em inglês que chega para a gente é bem ruim - e, de repente, todo mundo é mestre em coisas como fluência, “bom português” e “bom texto”. (Obs.: Era um mail; alguém escreve “que nos chega” em um mail? Não? É, eu e o Doppel também achamos que mails ficam entre a fala oral e a escrita.)

Acompanho mais ou menos o blogue do Danilo e achei elegante o que ele falou, mas fiquei irritado com a tréplica da tal Rosana no seu site sobre a necessidade de “ser bacana”, essencialmente. Como se ela tivesse sido “bacana” ao resenhar (sic) o livro. [Turpilóquio, turpilóquio]. Gotta go, mas quero voltar ao assunto.

E hoje recebo uma observação adicional:

PS - Sobre publicar parte do meu mail, claro, é só tirar os palavrões [CDC: palavrões substituídos por “turpilóquio”, numa tentativa de aumentar as consultas aos dicionários]. É bem como me sinto em relação a tudo isso; sendo que o “tudo” vai muito além do “episódio Jobs”, englobando a covardia implícita nessas “críticas” de internet.

Como você disse, ninguém sabe ou pode saber que [trecho cortado por questões contratuais; substituir por “ninguém pode saber as circunstâncias reais de cada trabalho”], mas ainda assim todos se vêem no direito de criticar o que bem entendem, protegidos por essa distância segura e, por vezes, pelo anonimato que a internet proporciona.

Criamos um monstro onde quase ninguém é crítico e todos criticam. Anyway, more on that later - também estou, se não atolado, com bastante coisa para resolver aqui.

O que é preciso dizer, em outro post, é o número de situações do tipo “resolve aí” que qualquer tradutor - ou qualquer um que esteja produzindo qualquer coisa, na verdade - se vê obrigado a solucionar, algumas vezes bem, outras “para ontem”, “como der” e “com urgência”.

Posso fazer um paralelo com Coca-Cola. Produzida industrialmente, com ISO É Isso Aí e ISO A Quilo. (ISO 9xxx é um conjunto de normas, práticas, formas de documentar processos etc que NÃO garante NADA sobre a qualidade. É vendido para os consumidores desta forma – marketing, como amo te odiar –, mas não é verdade. Se você seguir o procedimento chatérrimo necessário para obter um certificado ISO, poderá, teoricamente, certificar que a merda produzida no banheiro seja “Padrão ISO 9000”. Não se trata de ser “de qualidade”: trata-se de algo que é “sempre igual”. Curiosamente, o paralelo escatológico não é meu: ouvi, anos atrás, de um consultor de implementação de padrões ISO.)

Coca-Cola. Controlada e processada por muitas máquinas. Tirando o problema geral de armazenar coisas no calor do Brasil, em geral vem sempre igual. Ninguém deseja que haja ‘criatividade’ entre diferentes latas ou garrafas de Coca-Cola: queremos tomar “a mesma” Coca-Cola. 

Transponha para o universo dos livros. Foucault. Dan Brown. Baudelaire. Osho. Umberto Eco. Nora Roberts. Derrida. William Gibson. And so on. Tente pensar que você, leitor, quer seu Foucault com a mesma “qualidade” da sua Nora, do seu Dan. Quer que Osho passe pelo mesmo processo que Derrida, que Gibson seja traduzido como Baudelaire.

É estranho, não? Na verdade, é impossível e inviável. Contudo, em parte é nossa idéia de como “tudo” (Humanos inclusive) deveria ser, hoje. Não dá para traduzir Foucault e Derrida sem “transcriar” o texto (o termo-conceito é do Haroldo de Campos e, antes, do Ezra Pound, dois gênios da poesia e da tradução poética). Não dá para traduzir Osho “direito” sem editar *muito* o original em inglês, já que, embora o “público geral” não saiba, os cento-e-poucos livros de Osho são essencialmente palestras, conferências e falas em público que seus discípulos anotaram e que hoje pertencem à milhonária Osho Foundation. Para quem acha que Osho é sempre igual em inglês, informo que não é. A mesma Osho Foundation decidiu, em momentos diversos, não editar - no sentido forte, de “mexer no texto” - ou editar muito os livros de Osho. Esses são os “originais” que recebemos para traduzir.

Um pouco mais à frente na cadeia planetária de reprodução de textos, Osho é editado no Brasil por mais de uma editora. Cada uma delas têm uma visão diferente sobre “como deve ser Osho” e é fácil, numa livraria, pegar dois ou três livros diferentes do Osho, publicados por diferentes editoras, e ver que algumas estratégias geram um resultado “melhor” do que outras.  Onde “melhor” pode ser entendido como “que vende mais”, “cujo texto é mais agradável de ler” e “que é mais fiel ao original”.

Notando que as três coisas acima podem requerer opções bem diversas.

Quem controla isso? Who watches the watchers, e outras expressões no gênero? Não é ISO. Felizmente, do contrário teríamos chegado ao fundo de um poço de burrice. (Vou ficar muito feliz quando superarmos a “fase ISO” em qualquer coisa que não seja um processo industrial - não sou “contra” ISO, já que obviamente gostaria de dizer que todos os carros modelo X da marca Y são iguais. Com ou sem ISO, nunca são.)

Compreender “quem controla isso” passa por entender “como isso é produzido”. O que passa por entender como é a longa cadeia que começa na contratação de um livro – a aquisição dos direitos para tradução, que já é problemática – e termina …. quando? Pois é. Pensar se termina após a revisão final de português, a impressão do livro ou se ainda é necessário pensar na distribuição, exposição em livrarias e na percepção e recepção públicas do livro é, em si, uma questão.

Corto aqui.

Retomo depois, em outro ponto.

CDC

References (1)

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  • Response
    Wonderful Web page, Preserve the wonderful job. Regards!

Reader Comments (5)

Esse paralelo escatológico das normas ISO é uma piada antiqüíssima que todo mundo da área já ouviu. Já tinha ouvido do meu ex-professor de Normas, curso técnico de eletrônica no CEFET.

E eu acho que eu sou a única pessoa que usa esse espaço dos comentários aqui no site, devo mandar e-mails também?

d.C. 2010/3 | Unregistered CommenterFroyd

Inclusive, dado como o pessoal dessa área é, já devem ter criado um padrão para todo mundo que conta essa piada contar do mesmo jeito. Cuidado, Carlos, seu blog não está de acordo com as normas ISO9042 que diz respeito a contar piadas sobre merda.

d.C. 2010/3 | Unregistered CommenterFroyd

Não, Froyd, os comentários são bem-vindos - é só que nos conhecemos a tempos da Improbabilidade Infinita e talvez o restante do pessoal não esteja comentando, por um motivo qualquer.
O site ainda é muito "novo", tem um longo caminho pela frente, com comentários e com o resto todo.
- - -
Sobre a piada, sim, suponho que "eles" tenham um Padrão ISO para piadas. Mas eu de fato ouvi essa comparação dita por um cara que estava fazendo uma auditoria numa empresa de exploração marítma, algo assim. Faz tempo. Pelo que você diz, é "quase domínio público", então...
~;0)

Eu, pessoalmente, não tinha comentado por que não sabia se isso estava entre as funções do site, até que em um texto o Carlos escreveu algo como "comentem, droga" e daí isso resolveu as coisas.

Vi algo como isso em um livro (que eu não li inteiro, admito), do Alvin Toffler, que dizia que uma das consequencias do industrialismo era que determinados ideais do industrialismo acabaram inevitavelmente vindo para o resto da vida, como pontualidade, produtividade, (insira aqui mais alguns dos vários que ele citou no livro) e no geral padrões de qualidade, como tu bem disse no texto.

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Agora, sobre blogs sobre tudo, eu posso dizer que o meu blog é um desses. Claro que eu nunca postaria nada do tipo, nem de intensidade tal, como a tia aquela fez sobre o livro da Apple, mas em determinados momentos eu me dou a liberdade de falar sobre o que eu acho de certo assunto, não que o que eu ache seja lei ou algo assim. O blog é escrito conforme a minha visão das coisas, mesmo que as vezes eu não tenha estudo específico sobre essas coisas.
Não é uma crítica, por que eu não me encaixo tão bem no perfil de blogueiro que tu citaste, uma vez que eu nunca pisaria com os dois pés em um rio que eu não conheço (como a tia fez) e sei um pouco mais das coisas que eu escrevo (como não foi o caso da tia). E até mesmo porque meu blog não tem pretensões de ser formador de opinião em um círculo maior do que o das minhas amizades, sendo sua única pretensão praticar algo que eu gosto, que é escrever.

Abraço!

d.C. 2010/4 | Unregistered CommenterMarcus Vinícius

"todos se vêem no direito de criticar o que bem entendem, protegidos por essa distância segura e, por vezes, pelo anonimato que a internet proporciona".

essa é a minha deixa! que não vou deixar passar, vou criticar as mudanças recentes por aqui, e dizer que gostei deveras.

(ops. alguém escreve "deveras" hoje, num comentários como este? não. pelo jeito, como os mails, comentários deveriam ficar entre a escrita e a oralidade. preciso apagar esse deveras. mas também não queria usar o "muito"... muito não diz quase nada. pois que fique o deveras. e se alguém quiser criticar, que o faça. ai, de novo. essa próclise, esse "o" também não pegou bem. acho que terei que deletar este comentário.)

d.C. 2010/4 | Unregistered Commenteranônimo

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