da série “coisas que (ainda) me surpreendem”: Vaticano tem “Exorcista-chefe”

(versão revisada em 14 de março; agora com menos erros de português [é, eu sou copidesque e tradutor e escritor!, mas 4h da manhã tem vários efeitos colaterais!!] e ligeiramente mais engraçado.)
bom. assim. como é que eu vou dizer isto, ou como vou tratar do assunto?
talvez comece dizendo que achava que a Santa Inquisição já tinha acabado e que, com ela, essa história toda de “exorcismo” tivesse virado lenda ou, ao menos, uma prática não oficial seguida por aqueles que têm, digamos, um “excesso de zelo pela fé”.
ou posso começar com algo completamente diferente, pois me lembro de uma amiga que tem um filho particularmente endiabrado. ela, muitas vezes à beira de ataques de nervos por conta do filho, me disse, a sério, que o marido (e pai do filho) também era agitado quando pequeno. dizem que chegou a ser levado para que um padre o exorcisasse (a mãe dele, agora avó, tambem estava a beira de _____).
pelo que lembro dessa história, o padre exorcista já estava velho e meio doente, então levaram o meu amigo, na época um garotinho e supostamente possuído, até o padre relativamente enfermo. parece que o padre tentou de fato exorcisar o meu amigo, mas parece que não deu muito certo: o amigo em questão acabou mordendo o braço do padre, que desistiu do exorcismo e mandou todo mundo embora, com ou sem diabo no corpo.
o mais peculiar é que isso é verdade. há mais verdade nisso, até, do que em muitas coisas que Dan Brown diz serem verdade. (devo ter colocado Mr. Brown aqui porque sempre lembro da minha teoria de que ele recebe uma grana por fora lá do Vaticano, por seu bom trabalho de imprensa: quanto dinheiro teriam que gastar para terem a propaganda gerada pelos livros de Brown?)
voltando.
o Exorcista-chefe do Vaticano está em sites variados da web, por esses dias (e, se a web continuar como está, também nos próximos 10 anos, já que ninguém limpa nem apaga nada), por conta de um livro que publicou: “Memórias de um Exorcista”. não sei se já traduziram, mas o autor diz que tudo ali é verdade, ainda que eu ache que essa “verdade” tem o mesmo sentido que tem nos livros de Mr. Brown.
o CEO em Exorcismo tem 85 anos e se chama Gabriele Amorth. (que isso soe, em português, como o nome de uma moça - Gabriele - que está a+morth = “à morte”, bom, os idiomas possuem muitas coincidências bizarras mas juro que continua sendo muito verdadeiro!)
O Sr.Amorth concluiu, ao longo de seus anos de trabalho (e pelo pouco que pude ler on-line, acreditando, como sempre, que seja verdade), tudo o que a Sagrada Inquisição já tinha concluído vários séculos atrás.
a respeito da Sagrada Inquisição, das práticas das bruxas e das traquinagens de Satanás, recomendo comprarem o muy instrutivo tratado Malleus Maleficarum, publicado no Brasil com o título de “O Martelo das Feiticeiras”. o MM’s foi publicado na Alemanha, em 1487, elaborado, se a web bem me lembra, por Heinrich Kramer, Inquisidor.
juro que gostaria de retomar meu tópico inicial, mas não posso deixar de comentar quão bizarro é encontrar, na web (não podendo me dar ao luxo de acessar a Biblioteca do Vaticano com a mesma facilidade de Mr. Brown), a informação de que o MM’s — que muitos supõem ser o Guia Definitivo para a Misoginia e Caça às Bruxas — foi imediatamente colocado no Index Librorum Prohibitorum, latim para “lista de livros proibidos” pela Igreja.
mais peculiarmente ainda, parece (eu teria que navegar um pouco e confirmar isso) que Heinrich Kramer, um dos dois autores, acabou sendo condenado pela Inquisição. aparentemente sua demonologia era “contra” a demonologia oficial da Inquisição.
mas isto são suposições da web e Mr. Brown faria bem de checar os fatos antes de concluir alguma coisa e mandar imprimir esta versão da trama.
entrementes, eu ia dizendo que achava que o exorcismo era algum tipo de arte arcaica, quando descubro, hoje [12 de março de 2010], que existe o tal CEO de Exorcismo lá no Vaticano.
é mais impressionante ainda saber que ele lançou o livro com os relatos verídicos dos mais de 70 mil exorcismos que ele realizou (conta rápida: praticando um exorcismo por dia, sem férias porque o Diabo, todos sabem, não tira férias, o Reverendo Amorth levaria 191 anos para desendiabrar esse pessoal todo; então, ou ele praticou uns 3 ou 4 exorcismos por dia ou segue a turnê de alguma banda de Black Metal e vai realizando exorcismos após cada show).
ainda mais impressionante, contudo - e já estamos no nível 12 da escala de 1 a 10 de quão impressionante algo pode ser - é saber que ele declara formalmente que “o Diabo reside no Vaticano” e que há Bispos ligados a ele.
como diabos…. desculpem… como é que, sem nem mesmo contar com a ajuda de Longdong, ele sabe se um Bisco está ou não “ligado” ao Diabo? tal relacionamento de negócios vem impresso no cartão de visitas do Bispo? “Fulano de Tal, Bispo - Atendendo também como Adjunto Especial do Demônio”?
eu ainda acho que o problema (qual? bom, todos, bolas!) são os usuários de twitter, as pessoas “xem noxaum” e os usuários xem noxaum de twitter que não sabem algumas coisas básicas de História.
no princípio era o Verbo. Deus criou muitas coisas, ficou feliz com a maior parte delas, se deixou envolver no famoso incidente com a árvore, a serpente e dois incautos sem acessoria jurídica MAS, em momento algum, Deus criou algo sequer vagamente similar ao Inferno.
pois é: o Inferno não está no Antigo Testamento – sequer existe, nas Escrituras, um termo correspondente. as referências falam de algo parecido com o Hades dos gregos, talvez sombrio, talvez desagradável mas não “infernal”. em suma, nada que Dante pudesse ter usado como matéria prima para escrever a Divina Comédia.
devo supor – mas prometo perguntar à minha principal Fonte de Informações sobre Assuntos de Igreja – que o Diabo em si também tenha sido uma criação medieval, assim como o Inferno que, segundo me lembro, foi criado em torno do século XIII por motivos sócio-políticos da Igreja (populações com medo são mais facilmente controladas, mas por favor não digam isso aos estadunidenses, que poderiam querer tirar proveito sócio-político-econômico de algo similar.)
devo dizer que não sou católico apostólico romano. acredito, contudo, na Fé dos homens, a que permitiu que muitos de nós sobrevivessem a tempos difíceis, atravessassem as noites escuras, superassem misérias e erguessem catedrais e pintassem e esculpissem.
daí a pensar que há Bispos afiliados ao Diabo e “infiltrados” na Igreja e sair pelo mundo exorcizando pessoas… não sei. me soa como intriga, conspiração e como se fosse a versão best-seller de aeroporto do Vaticano.
eu, contudo, não sou o Papa e a mim não cabe redigir Bulas…
Reader Comments (2)
Não é tão louco se vc pensar q, de uma forma ou de outra, todas as igrejas têm essa preocupação com o exorcismo. A Católica, de certa forma, tem até uma burocracia (?) no julgamento do q precisa ser objeto de exorcismo, já q o Diabo é uma figura mais "top" e não sai por aí invadindo qq corpo disponível. Daí q 70 mil exorcismos soam mais estranhos ainda pra mim do q pra vc. As demais religiões trabalham com "diabos" e "obsessores", pluralidades, então presumo q as ocorrências sejam mais comuns. Há religiões evangélicas q têm dia e horário pra seus rituais, semanais, frequentes, o q me faz supor q a necessidade de exorcizar é normal, básica na rotina de vida humana (aliás, é impressionante como a maioria dos fiéis se preocupa com o assunto "demônios" - não seria pra deixar pra lá e viver pensando em "anjos"....melhor, não?) O espiritismo kardecista tem trabalhos sérios de desobsessão, envolvem não só "rituais", há palestras, doutrinação dos espíritos obsessores, uma preocupação não só de libertar o obsediado mas de fazer com q o obsessor seja doutrinado. (A doutrina espírita é linda, um luxo, pra mim a verdadeiramente mais generosa entre as visões cristãs, mas isso é outro assunto).
Então, não é tão louco se pensarmos nisso como preenchimento de uma necessidade religiosa humana...soa ridículo, apenas. Principalmente pros q acham q os melhores "exorcistas" são os bons terapeutas e q "demônios", em regra geral, não são entidades, mas coisinhas guardadas intimamente por nós.
E ainda é interessante extrapolar do caso do seu amigo:
70 mil exorcismos? se isso fosse mesmo verdade, (e certamente Amorth não contou), quantos não foram garotinhos endiabrados, alguns possivelmente traumatizados depois de se encontrar com Amorth?
quantos demônios no corpo - especialmente hoje, época em que expulsá-los é não só fácil, mas decididamente um show - não são a pura vontade de ser desculpado por algo? já dizia o filósofo:
" 'Eu fiz isso', diz minha memória. 'Eu não posso ter feito isso', diz minha vontade. Por fim, a memória cede"
hoje em dia, a vontade muitas vezes diz "um demônio fez isso"...