O Segredo do Segredo

Já faz tempo que todo mundo falou quase tudo sobre O Segredo. Bob Charles deu uma palestra explicando que apenas os Nono Bits têm O Segredo, e depois Carlos, filósofo terceirizado, falou coisas mais complicadas sobre um Descartes apaixonado pelo pensar, explicou a idéia de que ‘mágica’ só funciona para tirar coelhos de cartolas (e ainda assim porque eles já estão lá dentro) e que, no geral, o Universo não tem ‘fundo falso’, então dele não saem coelhos.
Isso e a parte de que, se houver um “Segredo Para Tudo” de fato, ninguém vai vender por 20 reais ou menos. Na verdade, alguns anos atrás, um sujeito que dizem ter sido meio diferente mas, no geral, gente boa, foi pregado numa cruz de madeira por propor coisas bem mais simples e nada secretas, tais como “vamos ser legais uns com os outros”.
A Seita do Nono Bit pensou seriamente em faturar alguns um punhado de milhares de dólar a mais lançando “O Segredo do Segredo”, com as continuações “O Segredo Secreto do Segredo” e “Mais Segredos que Vamos Contar Quando Depositarem Dinheiro na Nossa Conta”, mas o projeto foi engavetado porque os Nono Bits enviaram um bug de protesto, lembrando à Seita o seu compromisso com a seriedade, harmonia dos bits quânticos e, no geral, um mínimo de sensatez.
Bob mandou um mail me perguntando por que estão falando novamente em “noética” (ele escreveu “no – ética” no mail, mas deve ser porque está na Califórnia há tempos). Bob diz que o Grande Segredo de O Segredo é que serve bem de apoio para laptops de 12”, então a Seita pegou alguns exemplares no saldão para usar como suporte.
Bob disse também que tinha encontrado um Segredo muito maior, mas que estava no fundo de uma garrafa de Jack Daniels em um bar não muito recomendável numa estrada um pouco deserta nos arredores de Tucson e que, infelizmente, a garrafa se quebrou na briga de bar de estrada que se seguiu à descoberta de mais um Segredo.
Mandei um mail para um amigo do mercado editorial, atualmente escrevendo em um retiro num chalé no Lago Cuomo, não muito longe do local onde fica o castelo que Jung mandou construir por lá. Queria saber se ele tinha descoberto algum Segredo e o que achava da noética. Ele respondeu do jeito de sempre:
“Carlos, noética é uma ciência em franco desenvolvimento -- coloquei o pessoal da Oficina de Repetição do Mesmo para investir na área, os investidores acham que é promissor. Tudo o que precisamos fazer é encontrar um algoritmo que junte fatos disparatados da wikipedia, fique apenas com o que for completamente sem sentido, depois intercale isso com o novo protótipo que conseguimos do banco de dados de frases feitas para roteiros de Hollywood. Não posso falar sobre isso, tenho um NDA, é segredo “umbra” que os diálogos são sempre os mesmos. Mais secreto ainda são as frases subliminares, colocadas em ‘drop frame’, dizendo ‘você não vai se lembrar do que foi dito aqui’.
Fora isso, o que posso dizer? Ainda estou esperando que alguém aprove um projeto de drenagem completa do Loch Ness para descobrir O Segredo do Monstro do Loch Ness. Se encontrarem o bicho, dá um livro. Se não encontrarem, fico ainda mais feliz: teremos água para fazer scotch de qualidade e eu ganho dinheiro especulando que ‘o monstro’ morreu e se decompôs nas profundezas. Tem o livro narrando as investigações ao longo dos anos, com todas as teorias, inclusive a dos ETs. Tem um outro, falando sobre a drenagem em si, acrescentando toques dramáticos com a vida dos envolvidos. A partir destes eu produzo uma série de documentários com a BBC, o Discovery, a National Geographic. O contrato com a Disney está garantido: vamos produzir um musical onde o monstro é bonzinho, faz amizade com um garotinho solitário que perdeu os pais e mora nas margens do lago e, no final, liberta o monstro no mar (eu sei: água doce, água salgada – quem se importa, atualmente?). Finalmente, abro uma série de continuações, algo como “Segredos das Profundezas”.
Já que você mencionou o assunto, na verdade, a conclusão é que o cashflow gerado paga, com folga, a drenagem do Loch Ness, então vou começar a trabalhar nos contratos e nas reuniões aqui na União Européia. Obrigado pela idéia!”
Constato, lendo este mail, que, para meu amigo produtor editorial, a noética comprovadamente funciona. Provavelmente eu não estou tendo fé suficiente na coisa – melhor marcar umas sessões de análise para discutir essa minha falta de fé.
CDC