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Segunda-feira
set272010

fragmentos de um amor discursivo

2293050120_75397c6f57 longing [tags] Paula_x

 

pensei em te dizer tanta coisa mas no fim
é sempre o tempo que nos mata, nos cala,
e fica apenas
esse desejo espesso que pode ser sentido no ar vítreo
de dias quentes como hoje;
fica apenas esse
silêncio na caixa-forte eu
perdi a combinação nos escombros do corpo.

 

[crédito da foto: Paula Anddrade [1] ]

pensei em te dizer isso, aquelas outras coisas todas,
o ano que passamos em Marienbad; comentar um trecho
falar sobre os noticiários coisas que tenho composto
todo um jornal nacional a colocar no ar exceto que
momentos adequados não vieram não me encontraram em casa
as três mensagens perdidas no celular aquela carta perdida no México –
passaram anjos esparsos e, de resto,
teus seios colados ao meu rosto, horizonte de eventos.

acaba sendo tudo tão rápido quando é intenso
e no tempo – 45 minutos, 3 meses, 26 anos (quantidades distintas) –
só há sentido quando podemos senti-lo quando
quase pára
gruda nas escamas do ser
ondas de sal de mar abatendo
nossa consciência;

acaba tudo tão rápido, clarão tragado por escuridão
e todo o demasiado intenso comprime
o sangue adensa a eletricidade interneural e
borrado distante vertigem eu
sou espectador do filme que, no entanto, dirijo.

das coisas a dizer nada fôra muito importante
nada fôra nada não nada houvera senão te olhar:
teus seios: meu rosto: cabelos recobrem; você tem
um corpo de universo com gosto de luz bem clara, então
estar junto em nós é tão simples que inventamos essa
infernália complicada para que soe maior, do contrário seria o quê?

(desejo de compartilhar: meus olhos
entrelágrimas de sorrisos.)

reclamo ainda assim de algumas conversas surdomudo que travamos,
canais fechados freqüências assonantes
discrepâncias pragmático-discursivas.
talvez eu, preso nas urgências de minha cotidianidade imprompta,
tarefas prazos ligações contratos – já foi;
talvez você, procurando sei lá que distanciamento silente em outra
que não si mesma
(o que você quer, de fato? me diz, anda, faz, vai,
mas não empata a foda porque é isso que fode, tudo)

em meio aos sobrinhos abusivamente barulhentos
àquele meio de mato meio de nada onde você estava;
isso e o maldito telecom que não está não está lamento ela partiu.
reclamo assim agora aqui sabendo que nada será / foi
daquele jeito d’outrora e, sim,
tudo que foi teve que ser, daquela exata forma,
daquela exata forma: era nossa única, a possível.

nada impede sacodir a varinha mágica
balbuciar alguma besteira e
pronto!, teremos mudado por inteiro o estado de tudo.
(a realidade é tão somente uma rede de desejos, não me enche com trivia,
reconfigura e procede, o universo segue, tudo se segue daí)

e meu desejo agora é interromper isso
partir deixando abaixo outro texto que escrevi
não só para você mas
também para você, pouco depois.
feche a cortina;
apague a luz;
mexa-se na cadeira e – silêncio –
o primeiro
personagem acaba de entrar.

SEGUNDO ATO

 

- - -

[1] Para ver as belas fotos da Paula Anddrade, sugiro visitar a página dela no Flickr.

Sábado
set112010

Violência & Literatura ao longo da História

Prometi a meu bom amigo Luis, do Janela Lateral, que transformaria em ensaio (que ele vai enviar e eu vou publicar aqui, na minha “versão expandida”) um comentário que fiz esta semana sobre uma newsletter dele em que o assunto era a visão de Huxley e Orwell sobre distopias. 

Este é meu primeiro prólogo ao assunto – uma reescrita de um texto original de uma grande pensadora que jamais desejou se publicar (nunca entendi por que, mas respeito o desejo dela). Entretanto, a essas alturas, há muito em mails.

Leiam em itálico. O texto não é totalmente meu, mas retrabalhei muitas coisas (e a teia de teias com filmes é muito a minha cara, minha escrita).

- - -

O que pensei é que através da história o grande meio de se falar da violência sempre foi a literatura.

Na Teogonia, de Hesíodo, já há todo um discurso sobre o poder - quem detém o poder e como você pode ser castigado se não for muito esperto. Lutas familiares em torno da divisão das terras já existem em Os Trabalhos e os Dias, também de Hesíodo.

Homero nos fala do estabelecimento do poder no mundo helênico - os senhores das guerras, as alianças entre as Nações-Estados. Tróia é uma cidade mítica que a maior parte dos estudiosos acreditam nunca ter existido historicamente – metáfora, símbolo, meme.

As tragédias gregas da fase clássica nos relatam as brigas entre pais, filhos, soberanos, vassalos, estado, cidadãos. Discute-se o direito da Pólis e o lugar do sagrado  em Antígona; Édipo mata o pai, toma seu trono e depois arranca seus olhos para não ver o que tinha feito: usurpou o trono do pai e não ouviu o oráculo. O incesto, talvez ponto central do texto, hoje, não parece ser o que mais horrorizava os gregos.

A Bíblia do Antigo Testamento é de enorme violência. Não poderia ser filmada, hoje, e seria muito mal recebida como obra ficcional por seu caráter preconceituoso e pela crueldade. Só há um Deus verdadeiro em nome do qual as mais diversas atrocidades são cometidas, mas tudo bem, Deus justifica tudo, há um Propósito. Não saímos muito disso em 2000 anos – em vez de pedras, jogamos Tomahawks, contudo.

Na Idade Média, os trovadores encontravam meios de burlar a censura para falar do amor e do erotismo, ainda que sujeitos a determinados códigos. Muitas coisas que não podiam ser ditas eram transmitidas em forma de código nas artes – música, poesia, pinturas, esculturas. Leonardo escreveu muita coisa espelhando a própria escrita para não ser descoberto e Galileu usou retórica para se livrar da Santa Inquisição.

Um pouco antes, na fundação do imaginário anglo-saxão (e normando, e bretão…), as lendas arturianas nos falam de justiça, da busca pela Verdade, do amor, da prepotência. Na Távola Redonda, Artur – o Rei - e seus companheiros se reuniam como iguais em torno de uma mesa, numa volta à Ágora ateniense, em que uma elite de guerreiros tinha o direito a voto.

Temo pelo dia em que refilmarem o Rei Arthur com o Russel Crowe no papel de Arthur e prefiro ficar com a figura perturbada do Arthur de Excalibur, dirigido pelo John Boorman em 1981, mágico em sua releitura de Arthur; Merlin e Morgana são dois personagens formidáveis, maiores que o filme. [1]

Passamos para Cervantes e o romance de cavalaria, combatendo moinhos de vento, Quixote como o paradigma da utopia, mas Quixote era louco e, quando recobra a lucidez, desiste das lutas (?).

Shakespeare com suas tragédias bárbaras retoma o longo thread da violência, do estado, do poder, do sexo, dos ciúmes, dos conflitos e paixões e da amizade e traição e usura… Há algo que Shakespeare não tenha mencionado?

Não sei qual das tragédias é mais terrível. Ricardo III, por ter nascido feio e coxo, se acha no direito de fazer tudo o que pensa para atingir o poder que não se quer ameaçado; Macbeth, em que o casal se junta para dizimar todos que servissem de empecilho para a tomada do poder, em que os crimes eram tantos que Lady Macbeth não podia lavar o sangue de suas mãos. Titus Andronicus, um filme de terror em que os inimigos servem de um lauto banquete e a crueldade nua do texto serve para marcar melhor a sordidez e a violência da época. Há mais, porém não haveria espaço.

Camões escreve seu poema épico, conquistas e conquistados, a arrogância de Inez, que só pode ser rainha depois de morta.

Teria que mencionar De Sade, o Marquês que foi mais longe do que qualquer coisa que possamos pensar, hoje, e possamos admitir como possibilidade de escrita, hoje, mas De Sade será um capítulo à parte em minha tese.

Os séculos vão se passando e a violência pode estar mais encoberta ou pode ter se individualizado em serial killers ou se banalizado em thrillers nos quais “tudo explode”, então já não importa mais. Ainda assim, há uma veia aberta que permanece – corre sangue, true blood.

Nem sempre os escritores são queimados, mas queima-se a sua alma, os seus livros. Livros e bibliotecas sempre foram queimados – Alexandria, ao que parece, por um engano, omissão ou detalhe técnico -, mas há sempre um exemplar que se salva.

Os livros, a palavra, as narrativas continuam a ser ainda a maior forma de SubVersão.

Glória / CDC 2008 ~ 2010 [em andamento, suponho]

 

[1] Nada a ver com o artigo, mas o casting de Boorman é um daqueles que deixam um cinéfilo meio aturdido: não vou listar todo mundo (o IMDB lista), mas eu lembro que Liam Neeson estava lá; diabos, Helen “The Queen” Mirren estava lá, belíssima; e, mais fascinante para os trekkers, Patrick “Captain Picard” Stewart faz o papel de Leondegrance.

Quinta-feira
jul292010

Como escrever [sem ser óbvio]

a primeira coisa é definir que não há regras: por exemplo, criar uma regra dizendo que não há regras e começar com isso.

pensando um pouco, você pode notar que paradoxos também funcionam bem: se eu fosse escrever uma série de artigos sobre “como escrever”, sabendo que eu não gosto de regras nem do que é óbvio, poderia tentar um paradoxo: chamar a série de “Como escrever”, e acrescentar “[sem ser óbvio]”.

os paradoxos muitas vezes são uma saída fácil e tola. gosto quando é possível usá-los com ironia, sobretudo quando é possível criar uma (suposta) auto-referencialidade ou extrapolar isso e dizer que sua (pretensa) auto-referencialidade é uma meta-referencialidade.

você fecha esta parte do assunto sem explicar mais nada, você muda completamente de tópico e, sem nunca perder de vista a escrita em si, diz:

eu estava fugindo hoje do segundo engarrafamento sucessivo quando, já tendo entrado na terceira rota alternativa, notei que estava em um canto tão estranho da cidade que a melhor definição seria dizer que, lá, o álcool (quem diabos sobrecorrigiu o nome para “etanol”?) custava quase 40 centavos a menos que em qualquer posto da cidade.

você tem idéia de quão longe está de qualquer centro quando sua melhor referência é notar que o etanol está 40 centavos mais barato? e onde fica a coragem para colocar isso motor adentro, sabendo bem o custo das peças se tiver entrado água no etanol barato?

é o que posso dizer de melhor e talvez tenha sido a coisa mais interessante que pensei hoje, embora as muitas pessoas com quem interagi (foi um dia interativo, devo dizer) possam ter achado mais relevantes os meus comentários sobre a bomba d’água de auto-sucção que atormenta o prédio (era algo assim, eu sou recém-síndico, me dêem uma chance, na praia de hidráulica sempre fiquei na areia que, ainda assim, evito por ser metáfora óbvia).

o que eu pensei em seguida? bem, se você escreve hoje sobre etanol e 40 centavos, e ninguém vai saber o preço do etanol e quão significativos esses 40 centavos são, nem em 5 anos nem em qualquer lugar fora daqui, como eu uso uma imagem que é ao mesmo tempo interessante – ela diz tudo sem ter nenhuma relação com o que expressa, de onde a força; aliás, estou quase retomando o Manifesto do Surrealismo, aqui; mas é provavelmente por isso que eu digo que toda a Arte Moderna vem do Surrealismo, sem o qual estaríamos presos ao automatismo da objetividade (oops!, nós estamos presos a twittar o automatismo da objetividade da rede) //

// como eu uso uma imagem que é ao mesmo tempo interessante mas também me parece facilmente incompreensível.

isso é um pensamento em andamento, eu só queria abrir, não fechar.

http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/sobre-a-escrita-um-divertimento.html

http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/como-escrever-um-inicio.html

http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/como-escrever-ndash-todos-os-finais-possiacuteveis-parte-2-o.html

http://www.doppelganger.com.br/improbabilidades/dada-dadaismo-no-e-gaga.html

 

Quarta-feira
ago122009

Schrödinger, making of

“Schrödinger” é um romance que está sendo escrito por Charles Kowalsky. não é seu primeiro livro, mas é seu primeiro romance. boa parte do que Charles tem a dizer sobre o processo de criação de “Schrödinger” está, ou vai estar, no blog de Charles Kowalsky incluído aqui, no Projeto Doppelgänger.

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