Imagens & Tópicos
Das internas

Entries in Idioma (6)

Domingo
jul042010

Sobre a Escrita (um divertimento)

Considere que é um exercício. Um ensaio.

.

A mão precisa desenhar pequenos símbolos de traçado vazado na superfície de uma folha de papel.
Outra vez de novo. Usando diversas cores canetas diferentes fontes.
Até (a mão) sangrar vermelho misturando-se com branco de 
palavras conformando matéria papel machê compondo
máscara que será a nova persona moldando minha
face.

Considere (que é) uma preparação sem fim

para aquilo que nunca virá:

Sala de Espera

para o fim do mundo.

 


Quinta-feira
jul012010

Como usar “ao invés de” e “em vez de”

Da série “Sendo Sensato com a Língua Portuguesa”.

Todos nós, escritores ou não, profissionais da indústria editorial ou não, temos (suponho, mas suponho com razoável certeza) pontos cegos. Coisas que nunca conseguimos lembrar ou, mais precisamente, talvez coisas que não nos interessem o bastante para merecerem ser lembradas.

Eu sou quase incapaz de lidar com “regras” sintáticas. Ênfase no sintáticas. Para mim, quase toda a gramática funciona com bases semânticas. Eu tenho a gramática semântica da língua portuguesa de Mário Vilela e Ingedore Koch, uma colaboração Portugal – Brasil editada pela Almedina.

E toda vez que minha filha, agora com dez anos, me pede ajuda para estudar português eu fico atrapalhado, porque fui treinado para identificar problemas nas ‘regras’, mas criar uma ‘boa regra’ para uma criança de 10 anos não é trivial. Espero poder melhorar isso, um dia.

Por enquanto, posso resolver esse dilema completamente sem sentido, para mim, existente entre “em vez de” e “ao invés de”.

Dizem que “em vez de” significa “no lugar de” e que “ao invés” tem sempre um sentido de “oposição”, como se fosse um “ao contrário de”. Tentar diferenciar “oposição” de “substituição” numa frase normal, contudo, em geral é muito difícil ou impossível.

E, enquanto alguns manuais de normas (editoriais ou não) dizem que são coisas diversas, o “Guia de Uso do Português”, de Maria Helena Neves [Unesp] – um guia que eu acho particularmente bom e sensato e que não tem a arbitrariedade dos “manuais de redação” publicados por alguns jornais – diz o seguinte: “A expressão em vez de significa: […] ‘ao invés de’, ‘ao contrário de’ ”.

As duas expressões são iguais? Depende do ponto de vista, como tanta coisa em gramática.

Mas, como dá confusão quando alguém ‘resolve’ que são diferentes, eu resolvi usar apenas “em vez de”.

A vantagem é que “em vez de” sempre - sempre –pode ser usado ao invés de / em vez de “ao invés de”.  Brincadeiras à parte, é isso mesmo: em vez de usar ao invés, use em vez. Ah, bolas!, estou sendo irônico de novo!  ~;0)

Em vez de sair, entrei. Em  vez de me irritar, achei divertido. Em vez de chover, fez sol. Em vez de vetar a medida, aprovou-a.

Ainda não encontrei um exemplo em que ficasse realmente estranho usar “em vez de”.

Não é regra, mas é o que me parece mais sensato.

CDC

Quarta-feira
jun232010

Regências bizarras no jornal 

A manchete d’O Globo de hoje é: “Aumenta a dependência do Brasil ao capital estrangeiro”. Eu paro na cozinha, perplexo, e fico pensando: como alguém depende ao alguma coisa?

Não pode. Não sou gramático, sou sensato - o que talvez me torne meio cruel, às vezes, porque acho que a semântica - ou a “lógica dos sentidos” daquilo que falamos e escrevemos - vem antes de qualquer regra obscura que alguém possa invocar para publicar uma manchete dessas.

Se você diz “dependência ao”, do jeito que está lá, então poderia dizer “estou muito dependente ao cigarro”, “acabei me tornando dependente à Coca-Cola”. Alguém diz isso? Pois é.

Se diziam em maio de 1935 e foi parar na edição não revista e não atualizada de algum dicionário raquítico de Regência Nominal, eu lamento. Em 2010, temos os usos válidos em 2010 e não há motivo para publicar um ‘toiso’ desses na primeira página.

Minha próxima pergunta é: como resolver o problema. Óbvio que não dá para dizer “Aumenta a dependência do Brasil do capital estrangeiro”. Fica ambíguo.

Não escrevo manchetes de jornal, eu sou sensato. Teria dito “Brasil depende cada vez mais do capital estrangeiro”, o que teria evitado os dois problemas.

Pessoas sensatas têm problemas insanos.

E este é um post curto só para manifestar minha dependência “à” lógica no idioma português (e nos outros também).

Quarta-feira
jun162010

O que é ‘Traduzir’ - parte 1 de infinitas outras

Acho que é hora de eu retomar minha idéia de escrever sobre tradução, não do ponto de vista mais técnico, falando sobre práticas e preços e formas de fazer as coisas, mas pensando em algo um pouco mais amplo e tentando, talvez, ajudar o famoso “público geral” a entender um pouco melhor o que é feito durante uma tradução.

A primeira coisa a dizer é que traduzir palavra por palavra não funciona. A segunda coisa a dizer é que traduzir literalmente, frase a frase, continua não funcionando. A terceira coisa a dizer é que não há uma única forma de traduzir, não há uma única tradução possível e, na maioria das vezes, tradutores discordam de outros tradutores quanto às soluções encontradas.

Mas isso vale também (de outras formas) para medicina, consultoria, programação e tantas outras coisas, não é?

Tradução é um aprendizado constante, uma tentativa de superação a cada livro. Tradução é procurar, dentro de um livro, aquilo que é O Livro (nele), e tentar colocar isto para fora da melhor forma possível, deixando todo o resto (aquilo que não é O Livro) em segundo plano.

Se soa confuso, basta pensar em algo ainda mais confuso: nem sempre os autores sabem o que querem com uma palavra, uma frase, um parágrafo. Nem sempre os autores são bons ou seguem uma lógica razoável ou explicam algo de forma compreensível ou dominam realmente bem seu idioma. Ainda assim, e sobretudo nesses casos, o tradutor é obrigado a completar as lacunas, a encontrar um sentido vago, que seja, mas que ‘encaixe’ no texto e que, na melhor das hipóteses, seja tão aberto / vazio / ilógico / ambíguo quanto o original.

Como leitor, nunca se esqueça de que nós, tradutores, partimos deste ponto de partida já cheio de muitas limitações, que é O Original. Logo em seguida temos que lidar com uma segunda coisa complexa: todas as referências sócio-culturais filosófico-existenciais pop-internéticas etc. que um autor tem em seu idioma e que nós, aqui, em português do Brasil, não necessariamente temos.

Como tradutor, a primeira coisa que você precisa esquecer, ao começar uma nova tradução, é que existe um “autor” que precisa ser respeitado. E há uma coisa de que é preciso se lembrar, a cada livro: ele é único, ele precisa ser entendido e traduzido como algo único, ele não é “igual” ou “parecido” com quase nada que você já fez (infelizmente, hoje, isso não é mais verdade, mas seria um outro longo assunto). Além disso, o texto em sua tela só tem uma chance no mercado e depende, em grande parte, de você para viver e para poder chegar às pessoas que desejam ler aquelas palavras.

Devemos fazer uma pirueta paradoxal e, enquanto  apagamos essa figura autoritária do Grande Autor que é preciso respeitar, precisamos ter dentro de nós a idéia de que uma pessoa, um escritor (ou supostamente um escritor…) colocou seu tempo e (mais uma vez, supostamente) deu o máximo de si para criar aquele livro.

A arte da tradução está em ser capaz de apagar completamente o autor enquanto encontramos a voz mais próxima daquele autor, o tom mais harmônico para aquele livro. Uma tradução precisa ser transparente mas, para chegar a tal ponto, ela precisa antes encontrar a voz do autor em seu idioma original e transcriá-la no idioma de destino: no nosso caso, o português.

E precisa ficar fluente e natural. Uma das coisas que mais me irrita é quando pego um livro em português, começo a ler e uma buzina começa a tocar na minha cabeça dizendo “isso é uma tradução”. Não deveria ser assim: um texto traduzido deveria ser fluente a ponto de se parecer com o original.

Claro, nos casos em que o original é feito de cacos de sentido, ou sem sentido…. O melhor que podemos fazer é arrumar um pouco as coisas, mas arrumar demais seria “melhorar” o autor.

Traduções são desmontagens / remontagens de um livro, palavra por palavra, linha a linha. E, para cada trecho relativamente mal resolvido no original que um leitor poderia pular sem nem perceber, nós, tradutores, precisamos encontrar um sentido.

Há muitos outros sentidos para discutir e conversar quanto a traduções mas, para não ficar insensatamente longo, este texto interrompe o assunto aqui. [Como sempre, “Continua mais tarde…”]

Domingo
abr112010

Como escrever [redux]

[resolvi extrair a ‘versão executiva reduzida e resumida’ do meu primeiro ensaio sobre ‘Como escrever’, antes de continuar. aqui está ela.]

Como escrever?

1. Comece com o que quiser. Comece com o que tiver em mente.

2. Escreva como você escreve agora. Se tudo correr bem, se você gostar do que faz, com o tempo escreverá melhor.

3. Continue escrevendo e, sobretudo, transforme isso em um hábito. Caso não tenha nenhuma idéia, tente escrever seus sonhos - acho que são mais interessantes que as coisas que as pessoas colocam nos “diários”, até porque acho que ninguém aguenta mais os blogues sobre “Meu Querido Umbigo”.

4. Não fique criticando tudo o que você escreve. Ouça o que dizem a respeito, leia com carinho críticas e elogios, mas deixe de lado o ego. Você está em sua escrita, mas sua escrita não é você. Acho importante separar as coisas.

5. Talvez devesse ser [4], mas permita que as pessoas leiam o que você escreve. Interagir é importante.

E, eventualmente, assim como vou fazer agora, termine seu texto. Mesmo que você ainda tenha outras coisas a dizer.