Imagens & Tópicos
Das internas
Terça-feira
set012009

repositório

“o som da máquina de escrever era como um .38, só que mais rápido.”  e assim terminava o seu mais recente comcast, com um detetive típico dos antigos romances noir digitando, na última cena, a própria história em que estava incluído, aquilo que os consumidores teriam acabado de ver.

sono. olhando pela janela, ainda. impregnado com as imagens de muitos vídeos antigos que tinha visto durante aquela produção: o Repositório... tão estranho pensar que quase ninguém tinha acesso ao Repositório e que havia tantas coisas para se ver por lá. já não sabia se as pessoas se interessavam, se tinham tempo. e muita coisa tinha se perdido no Antes, quando a internet arcaica havia sido destruída, hordas de vírus mutantes invadindo sistemas, queimando bancos de dados, tudo... os vírus apagaram da memória humana tudo aquilo que não estava armazenado em mídia física nos Keiretsu. o Depois ficou com aquele buraco, um hiato entre o Primeiro Ciclo da Era Fora e o Antes.

já não era mais possível integrar os fragmentos. o que tinha sido era um passado estranho, tempo de uma outra Humanidade da qual restavam prédios, relíquias em museus, muitas peças soltas que se tornaram incompreensívels. alguns ainda pesquisavam, arqueologia do saber, mas já não era importante.

as mudanças eram importantes. o futuro seria sempre melhor. olhar para o passado era perda de tempo.

Sábado
ago222009

estética da pornografia, frag.210809

está bem claro, para mim, que é possível analisar quase tudo que há de importante na Cultura Ocidental Contemporânea (dos anos 50 para cá, digamos) investigando a fundo a Playboy nos diversos países onde é publicada. é uma tarefa complexa e que exige tempo, porque o material é enorme, mas a verba da Gatsby-Hughes Foundation deve sair e, acredito, nosso Centro de Pesquisas Avançadas logo poderá alocar tempo do supercomputador ShaggyRunner para ajudar nas análises.

o que eu descobri hoje, em um almoço casual aqui em Los Angeles, foi que a profissão de atriz pornô mudou muito desde que publiquei meu último prestigioso ensaio a respeito: “Getting fucked up, but not for free” (Journal of Behavioral Standard Deviations, Tschwotzcklm Verlag, 1992).

estava em meu projeto de pesquisa, almoçando com um grupo seleto de atrizes pornô, quando uma delas mencionou que gostava da carreira - ele sempre quis trabalhar no show business - mas que, na situação atual, um passo em falso significava que, dali em diante, você seria a ‘garota secundária’, aquela que fica fazendo figuração sexual enquanto a atriz principal é devidamente fodida, enrabada ou ambos, com variações.

de fato é um problema, pensei eu, enquanto anotava aquilo e o telefone dela para futura referência. me lembrou, é claro, um assunto relacionado que é o do sujeito que aparece durante 2 ou 3 minutos fazendo um papel realmente tolo em um filme importante. imagino o currículo dessas pessoas: “principal atuação: ter levado um tiro do Clint Eastwood em um filme premiado com Oscar”, ou “participou como mecânico trocando pneu, de costas, em um filme do Tom Cruise”, ou ainda “entregador de pizza em vários episódios de Two and a Half Men”.

não são papéis fáceis de conseguir, mas como fica isso num currículo? e como fica, portanto, a posição daquela bela moça cujo rosto era bonito demais, na minha opinião de produtor especialista, para não estar recebendo a principal ejaculação do filme na cara?

(por que as atrizes de pornô não aprendem a fechar logo os olhos ou tentar sair do ângulo ruim quando o garanhão de plantão vai gozar? as caras de supresa, nojo, o reflexo de tirar o olho da frente … são momentos realmente ruins em uma longa lista de filmes. talvez devessem usar um óculos de mergulho, para proteger os olhos, já que nosso reflexo para fechá-los é automático?)

mandei minhas anotações e a documentação filmada do Grupo de Pesquisa em Orgias para Tzschwotzcklm, para análises posteriores e também lançamento em DVD pirata na China, Tailândia e países próximos.

veremos no que dá.

Quinta-feira
ago202009

fragmentos de um espelho (esboço)

a imagem era um brancopreto granulado vinda de algum lugar perdido no meu Repositório Pessoal. ela estava em um quarto, olhando para baixo, para longe. havia algo de melancólico, havia beleza, acho que há melancolia na beleza. o reverso também vale.

foi a única imagem que me restou dela, muito tempo depois, quando nem conseguia mais lembrar o que senti por ela - nos conhecemos um dia? ela é (ou foi) real? não me lembrava sequer se eu estava naquela cena, naquele quarto, naquele tempo. não podia ver seus olhos, fechados e distantes dentro dela. o quarto, para mim, é uma imagem espelhada: os olhos fechados, de frente, e ao mesmo tempo um outro eu olhando por trás dela para objetos que não estão na foto: uma cama, um abajur antigo, dois quadros (ela pintava? não me lembro de ter comprado quadros), algo que parece um daqueles lustres de cristal, como havia na Europa Oriental antes da Queda.

talvez seja uma foto de produção. um filme, no início da minha carreira, ela seria a atriz. não tenho registro de ter produzido nada como aquilo mas, se foi mesmo antes da Queda, não haveria registros.

dentro de mim, eu não lembro.

se eu pensar na cor dos olhos, por exemplo, não sei em que penso: pretos, castanhos, azuis, verdecinza? todas as cores são imaginárias quando se olha para uma foto brancopreto e, se eu mandar colorizar digitalmente, será uma cor irreal, algo que meus sistemas terão interpolado usando um vasto banco de dados, medianas, padrões de reflexão - tudo o que a técnica pode me dar, mas nada além disso. novamente: o que isso teria de real, ou em que seria melhor do que inventar uma cor, eu mesmo, uma que me pareça bela naquele rosto?

de toda forma, com ou sem cores, aquilo que está fechado dentro dos olhos dela, o que ela pensava, está para sempre perdido.

só me resta a imagem e uma imagem nunca "diz" uma pessoa: nada diz uma pessoa por completo. 

Domingo
ago162009

vidas ao vivo

crepúsculo de cubatão: espero um lugar vagar no sofá da saleta de entrada, um andar acima da pista de dança, para sentar e conversar com os amigos que chegaram.

os banheiros eram mistos (um pouco mais que isso, suponho, já que nunca dava para classificar as sexualidades transientes de toda a fauna que passava por lá), ainda não havia ecstasy (designer drugs surgiriam bem mais tarde), new age era a moda e havia os que apareciam vertidos com coisas de brechó, coisas de renda branca, coisas de veludo cotelê, unhas pintadas de preto ou roxo, acho que já havia os Darks, que até hoje me parecem a versão um pouco diluída da fúria Punk, mas ainda assim não era um "movimento" StephanieMayer-Poser como os EMOs me soam hoje (e por quem os EMOs choram? pelo que se perdeu no caminho? pelo que acham que deveria estar aqui e não está? precisamos de Dada e de Surrealismo, não de EMOs ou de mais Posers ou de CosPlayers, brincando de jogos de japoneses nintendo-pokemon).

bebia-se, fumava-se, maconha estava "in" (sempre esteve, suponho - talvez não tanto hoje, quem quer parar no meio dessa sociedade Gonne in 60 seconds?), cocaína era coisa dos filhos de papai riquinhos querendo aparecer, mas sobretudo bebia-se, com muitos bares, muitos lugares fervilhando numa noite cuja jugular ainda não havia sido cortada pela violência constante, absurda, idiotizadora, pelo excesso de gente e falta de idéias, pela música imbecil, foor-on-the-flloor, a viagem sem propósito das raves, o lado burro do trance, a infelicidade enorme da alegria forçada do axé e da coisa inominável que é o Miami Bass (vulgo funk) de vocais desafinados, medonhos, e produção fácil, porque ninguém quer sequer perder tempo criando um groove sério para dançar.

playboys passam em carros de vidros abertos (o resto de nós usa o ar-condicionado, obrigado) e subwoofers superdimensionados colocados onde couber no carro, carros que viraram boomboxes portáteis para ficar na porta de bares e dessa coisa bizarra que é a "barraquinha móvel de trash food" feita em vans.

você ainda era um sonho distante que só chegaria anos mais tarde e, muito curiosa, viria um dia à noite me perguntar sobre um passado que só conseguiria lembrar direito se pudesse sentar com 3 ou 4 pessoas numa mesa e pedir que me dessem peças.

tenho um quebra-cabeças, algumas imagens nítidas, outras perdidas na mistura com as noites de sonhos de todos os anos entre lá-antes e aqui-agora, outras inventadas por mim para compor histórias que me reconfortem sobre o que fiz um dia.

pouca coisa na rede, pouca coisa sobrou, e eu vou reinventar um percurso longo escrevendo estes mails públicos para você

Quarta-feira
ago122009

Schrödinger, making of

“Schrödinger” é um romance que está sendo escrito por Charles Kowalsky. não é seu primeiro livro, mas é seu primeiro romance. boa parte do que Charles tem a dizer sobre o processo de criação de “Schrödinger” está, ou vai estar, no blog de Charles Kowalsky incluído aqui, no Projeto Doppelgänger.

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