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Das internas
Segunda-feira
nov222010

O Sonho (da civilização submarina) - parte 2

[prometi que ia publicar a segunda parte em 3 dias mas o movimento está realmente bom, então segurei mais um pouco para que as pessoas tivessem tempo de ler as duas coisas com calma]

Claro que a próxima questão é: sim, Cérebro; eu estou pensando no que você está pensando, mas como peixes criam máquinas

Boa pergunta, porque a tal civilização não poderia ser detectada por Humanos mas O Sonho queria que ela fosse altamente avançada. Como se cria uma civilização, portanto, literalmente debaixo de nossos olhos, sem que soubéssemos?

Claro que a próxima questão é: o que você entende por “civilização”, e como você pensa nisso no que diz respeito a criaturas submarinas cujos requisitos podem ser ‘alienígenas’, já que o mundo deles é bastante alienígena para nossos parâmetros?

Foi quando O Sonho modulou a coisa e respondeu: peixes não precisam de mecânica nem ferramentas, peixes precisam apenas armazenar, manipular e transmitir informações - essa seria uma civilização em outros moldes.

O Imaginário achou que O Sonho estava indo por um bom caminho e pediu um reforço tanto à base de dados sobre a Realidade quanto um pouco mais de esforço do Racional, que estava reclamando muito dessa barulheira toda num momento em que ele (e o Corpo) tentavam continuar dormindo mais um pouco.

Mas eis o que Sonho pensou:

Os peixes, liderados por baleias e golfinhos, duas espécies capazes de se comunicar a longas distâncias, capazes de usar sonar e mergulhar muito fundo (baleias) ou trabalhar em grupos (mais os golfinhos, suponho) …. os peixes, mamíferos ou não (“peixe” sendo tudo o que ‘nada debaixo d’água’, e dane-se essa frescura dos biólogos com as classificações das espécies!), desenvolveram uma tecnologia de codificação de informações por …. (aqui entra a música de suspense e emoção) …. cadeias de proteínas ou aminoácidos. 

Mas o que você usa como banco de dados e computador biológico no fundo do mar? A resposta é óbvia: o lugar ideal para armazenar e manipular dados seriam os corais, que podem ser percorridos como uma matriz 3D por uma série de “leitores” de informação como as estrelas do mar, por exemplo.

Aí O Sonho começou a pensar que seria interessante se, cheias da exploração predatória dos oceanos, baleias e golfinhos mandassem um ultimato para os Humanos dizendo que algumas coisas (como a pesca de baleias e golfinhos, por exemplo) teriam que cessar. O Sonho começou a imaginar possíveis ações terroristas subaquáticas, como cortar nossos cabos de comunicação submarinos ou atacar plataformas de petróleo pela base.

Acabei acordando bastante cansado, mas a história ficou quase pronta. A última pergunta interna de que me lembro era um pedido sério de consulta ao Cérebro Todo (bom título, aliás - “Isso que chamo de Cérebro”, algo assim) para definir como é que os golfinhos iriam interagir com as outras espécies, já que ninguém “fala” nada em comum lá embaixo.

Como eles organizam as forças de ataque dos tubarões e orcas, por exemplo?

Qual o papel dos pinguins nisso tudo, e que Segredo terrível o Vaticano esconde no Pólo?

Mais importante ainda: como criar uma interface entre os cabos de dados e os golfinhos? Alguma criatura marinha teria que injetar sinal nas fibras óticas para se comunicar com os Humanos, e nesse ponto me perco um pouco, mas acho que ainda dá para resolver.

Por vezes acho que preciso passar mais tempo dormindo.

Sábado
nov132010

O Sonho e a Avançada Civilização Submarina de Golfinhos e Baleias [uma viagem]

[22 nov 2010: título corrigido; revisão ortográfica e pequenas alterações no texto]

Acordei lentamente da minha “soneca da tarde” numa quinta. Odeio dormir à tarde, mas estava sendo uma semana difícil. Tive um daqueles sonhos quando já se está quase acordado mas, como estava muito (muito) cansado, não conseguia levantar e meu cérebro quase-consciente resolveu se meter no sonho e discutir assuntos. Foi divertido – e mostra um pouco por que alguns dentre nós têm a opção de escrever ou escrever ou enlouquecer.  ~;0)

Formalmente, para quem se interessar, é um texto sobre as relações entre as premissas dos textos ficcionais e o desenvolvimento de uma trama. Mas é também uma viagem completa – vocês, leitores, decidem o que querem tirar daqui. Eu estava só sonhando as coisas que sonho.

O Cérebro pegou um roteiro de filme de ação já interessante (meu sonho imediatamente anterior) e criou novos elementos em cima disso.

No primeiro sonho, o planeta todo era monitorado por computadores, satélites e câmeras, mas as corporações, os governos e as máquinas precisavam de pessoas especiais, sobre-humanas, munidas de implantes de GPS e câmeras de visão ampliada, para conseguir “ver” em lugares ou situações difíceis: nuvens atrapalhando os satélites, tempestades de neve e ainda aquelas vezes em que é preciso entrar dentro de cavernas ou mergulhar em mar revolto, por exemplo. Diria que parte disso pode ser feito por aviões-robô, e foi quando eu comecei a discutir comigo sobre essa premissa ter problemas de desenvolvimento.

Eu tinha criado um personagem que seria um “superagente” (bleargh de recauchutagem ortográfica!), equipado com um bote “inafundável”, e que ia se meter numa tempestade marítma para ver algo que os satélites não conseguiam ver – descobrir o que estava havendo com um plataforma de petróleo no Mar do Norte, por exemplo.

Claro que a próxima questão é: mas e se o bote inafundável for atacado por uma orca, a baleia assassina que não é baleia?

O Sonho passou um tempo pensando nisso. Nem discutiu se há orcas no Mar do Norte ou não, mas é uma questão importante. O problema d’O Sonho era se ele poderia criar um material e uma construção que uma orca, tendo aqueles dentes de orca e mandíbulas de orca, não conseguisse detonar nem destruir dando aquelas pancadas de orca com o corpo.

Foi quando O Sonho teve outra idéia legal, porque o Cérebro obviamente começou a se encher de pensar sobre como construir “botes à prova de orca” (a baleia assassina que não é baleia, acho que já mencionei), embora a indústria de plataformas de petróleo do Mar do Norte talvez gostasse de saber das conclusões a que cheguei. (Eu talvez ainda desenvolva a idéia como conto, porque gosto de um ser humano ‘no limite’ que sirva para fazer aquilo que, hoje, desejamos que as máquinas façam. É uma boa inversão de idéias, merece ser explorada.)

O Sonho resolveu então se lançar sobre uma nova hipótese e teorizar sobre o que iria acontecer se, numa “Hipótese Gaia”, os seres marinhos desenvolvessem uma civilização. De forma ficcionalmente coerente, deveria ser completamente diferente da nossa, e lembrei da minha neurocientista predileta dizendo que nosso Imaginário é limitado por nosso conhecimento do Real, então resolvi (ainda sonhando) que puxaria a coisa até o ponto em que o Imaginário tivesse que extrapolar sobre o Real e, modulando parâmetros, tentasse chegar a algo plausível, mas não existente ainda.

Ao menos não ficaria óbvio, entendem? Não seria uma trama do tipo “Atlântida” ou “os golfinhos na verdade são extra-terrestres” (embora Douglas tenha se saído bem com isso, mas, claro, a intenção de Douglas era ser non-sense). Foi o que O Sonho pensou, ao menos.

Para onde foi tudo isso? Para não ficar enorme, respostas & uma grande trama para Hollywood dentro de um ou dois dias, aqui no site.

Segunda-feira
nov082010

Google Earth nos céus, um bueiro na cabeça (um texto de Bob Charles)

Bob Charles me liga novamente, da Califórnia, para contar as novidades. (Leiam também “O Retorno de Bob Charles”, aqui no site, assim que eu publicar a ‘prequel’ recapitulativa do texto abaixo que fará parte do próximo livro de Bob Charles.)

– Carlos, tive uma ideia fantástica aqui para o Departamento de Marketing Produtivo da Seita do Nono Bit.
– Vão vender velas votivas binárias?
– … hum, puxa, isso é uma ótima ideia… Catherine, dear, please make a note about this digital candles idea… what?…. no, Catherine, of course I know candles are not digital, but it’s all about marketing, so we’ll just stick some big letters in the packaging saying DIGITAL CANDLES, obviously no one would question that… Desculpe, Carlos, a Catherine Zeta-Jones continua aqui me dando uma força mas ela algumas vezes é um pouco lenta. Ando pensando se aceito a oferta de estágio da Cameron Diaz, que também quer trabalhar para mim de graça, porque leu o livro do Chris Anderson, mas é chato ficar trocando de estagiária toda hora.
- Sim, Iluminado Binário, sua vida é complexa e difícil, disso todos sabemos. Mas diga-me, qual é este novo produto da Seita?
– Ah, uma coisa fantástica. Você já ouviu falar deste novo programa dos meus concorrentes aqui em Falo Alto, o Larry e o Sergey?
– Bem, eles estão com dinheiro sobrando, graças aos Crentes que clicam nos Google Ads para pagar o Google Dízimo, então andam fazendo muitas coisas. Você está falando sobre a missão tripulada a Marte para ampliar o Google Mars?
– Ah? Eles vão para Marte? Dessa eu não sabia… Catherine, would you please call our Chinese friends and tell them we changed our minds and will help them with that rocket software coding project? Pois é, Carlos, tem a ver com o Google Earth.
– Mas a Microsoft já está tentando criar um produto similar, Venerável.
– Pfff… Os Nono Bits transmitem Mensagens Digitais Psicografadas horríveis sobre Redmond. Mas meu projeto é outro: como um Grande Guru Informata, não quero que as pessoas vejam os Rituais Sagrados que faço aqui no Complexo do Nono Bit em Sausalito. Também não quero ser visto pelas ruas, quando caminho anônimo entre os mortais.
– Ó Supremo Digitalizado, mas dizem que só os militares conseguem bloquear o Google Earth de fotografar certas partes do território americano. Como isso será feito?
– Carlos, é uma daquelas coisas tão inteligentes que me deixam impressionado comigo mesmo! Vou vender tampas falsas de bueiro para as pessoas usarem como chapéu. Serão feitas de plástico leve e ainda servirão para proteger as pessoas dos malignos raios ultravioletas.
– Magnânimo! Isso é fantástico! Eu já tinha pensado em algo similar mas não achei que fosse vender.
– É claro que vai vender! Faremos milhões, Carlos! Imagine: ninguém mais será exposto a essa invasão de privacidade horrível – em breve todos estarão andando com tampas de bueiro na cabeça e, lá dos satélites, parecerá apenas que as cidades começaram a ter um número enorme de bueiros novos.
– Mas, Magnético Líder, e como você irá proteger o espaço aberto onde são realizadas as Cerimônias Sagradas da Seita?
– Boa pergunta, Carlos, boa pergunta. Meus engenheiros ainda estão em dúvida, mas a solução mais interessante, no momento, me parece ser aqueles ombre… umbre… Catherine, dear, could you please check in my Whouaiss what’s the right word for “big umbrella”? Yes, honey, I know you hate the Whouaiss, but that’s the best we have for… Yes, yes, we are planning to program something much better, but we don’t have enough time right now… How come you can’t find it? Again? But what’s this thing supposed to….You did find it using Google?I told you not to use Google! But, ok, that will do, thank you. “Ombrelone”, Carlos. Desculpe, mas a Catherine não acha nada no tal Whouaiss Digital, é um software deprimente, sabe? Nós vamos espalhar ombrelones pintados como bueiros do lado de fora, e o teto dos prédios vai ser inteiramente pintado com bueiros.
– Não vai ficar… como eu diria… um pouco ‘peculiar’, como se fosse o Encontro Anual dos Bueiros, todos eles juntos em um mesmo lugar?
– Bem, sim, você sabe, tem esse aspecto, mas, apesar de estranho, assim ninguém vê nada.
– You may be on to something, Bob!

Sábado
out302010

sol, praia e ordens médicas

não vou conseguir produzir algo mais engraçado, mais ácido, mais vivaz e mais eloquente (agora sem trema, me diz o incorretor ortográfico legamente correto) sobre essa história de ‘andar na praia e tomar sol’ do que João Ubaldo Ribeiro, em diversas crônicas no jornal, na época em que algum dos Homens de Branco lhe disse que deveria trocar uísque por guaraná, bar & conversa por caminhada, e sei lá em que dieta de regime forçado colocaram o nobre homem de letras.

mas é isso: homens de letras gostam de letras e gostam de pousar letras sobre papel. meu bar é a web, meu uísque red bull, sou um pouco diferente aqui e ali porém, como me disse certa vez a Sensei de Filosofia: “nada de útil se produz antes que o Sol se ponha”.

eram épocas sensatas em que trabalhávamos, eu e Sensei, de 18h às 3 ou mesmo 6h da manhã, produzíamos muito e eu voltava para casa feliz, vendo o sol nascer e jamais compreendendo que insanidade peculiar, mas claramente feliz, levava à Lagoa aquelas pessoas que eu via, 5h da madrugada, pré-Sol, correndo.

(para onde se corre, quando se corre? eu sei: o Zen me diz que não se corre ‘para’, se corre porque é bom ou porque correr possui algum centro; respeito, talvez admire; fora isso, sigo a Escola CEB de Pensamento João Ubaldo: conversa, escrita, birita.)

mas eis que chego aos 50, quase agora (mais uns 6 anos) e o Homem de Branco me diz que minha pressão isso e aquilo, elevada pelo estresse desse estar vivo no momento se encontra com esse e aquele valor para lá e para acolá, então eu que corra atrás.

fui. correr. na praia. sem falar nos dias em Noronha passados subindo, descendo, pedras, escarpas, agreste, escada, sol, sol, sol, calor, pedras, subir, descer, praia, um pouco, oceano, belo, pedras, peixes, nadam, observo, caranguejos, subo, desço, pedra, escarpa, areia.

correr. exausto. na praia. fui.

calor cão, suava profusamente, coração me xingando com vocabulário de torcedor de maracanã, motor de carro subindo ladeira em primeira (‘precisa correr mais, otário!’, algum espírito porquenho notará), eu xingando o Homem de Branco (vou culpar quem?, o Universo, ser sedentário, gostar de escrever e pensar, minhas horas de trabalho, ‘esse ritmo louco da sociedade atual’ … aliás, o que é esse negócio de que tudo tem que ter um culpado, na verdade? eu estava só esbaforido [do latim “ex+bafus”, sem ar; e queira deus que ninguém seja crente o bastante para levar a sério certas etimologias] …. estava ‘ex bafus’ e xingava o médico).

de volta à cena: cachorros, crianças com picolés, moças picolés emplastradas na areia, rapazes insanos jogando volei com areia bem quente, passantes de bicicleta - a coisa de sempre nessas cenas em que um autor pouco pode inventar.

na volta, temendo ficar como uma lagartixa que vi em Noronha — morta de secura porque correu para o lado errado no sol em uma longa faixa de areia —, tomo uma água de coco. ao meu lado, um dos jovens de 50 anos (ou 40 detonados pelo sol) sobe do volei e pede um conhaque Dreher na barraquinha. sem gelo. eu, incrédulo, quase sinto o álcool queimando, só de olhar. lembro do anúncio de algum guaraná que dizia “provoque a sede até não aguentar mais…” - bom, era esse cara.

volto, ainda esbaforido, mas cheio de planos para quando puder correr uma maratona sem muito esforço, lépido, fagueiro, esbelto, pensando em duas coisas: o que escrevo agora, da minha lista enorme; e que outra razão, senão profundo senso de surrealismo, faria alguém tomar conhaque ruim e quente num calor daqueles?

próximo assunto, que de praia já foi muito.

Sábado
out302010

poesia a seco

[produzido em 2000; prazo de validade indeterminado]

te deixei entrar,
ainda quando soubera
que trouxeste na língua
veneno que me mataria.

coloquei-me exposto em vitrine
para que levasses o que fosse
porquanto já seria mesmo teu:
pelo contrato, registrado
em ofício de notas, seria minha
contrapartida por jus e de direito
deixar-te estar comigo
sem prazos ou revogação.

tempo passado,
mudanças de continente
ponte em escombros
recebo no presente
teu silêncio e descaso:

não, nada; hora alguma.
passe depois, talvez?

daria meus restos aos cães
se me livrassem da irritação de viver
mas se foram contigo, eles também,
farejando no ar uma alegria
que não soubera lhes dar.