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Domingo
jan242010

Up in the air – a trilha sonora

[v-0.9; 24jan010]

[Esta é a versão “beta” de três ou quatro artigos diferentes. Vou colocar no ar, do contrário nunca começo a “saga” que vai, eventualmente, se chamar “The day the music died”. Leia agora, mas volte dentro de uns 10 dias e veja se mudei a versão aí em cima, provavelmente vou ter acrescentado coisas, desmembrado, ampliado e ainda tenho muito a dizer sobre “nova música”.]

Como disse no ensaio sobre “Up in the air” (ainda reclamando da tosqueira que é a tradução “Amor sem escalas”), a trilha sonora do filme me impressionou muito. Piquê? Piquê[*] meu lado ex-produtor musical + ex-engenheiro de gravação e amante de música com centenas de CDs e milhares de Mp3 começa a dissecar a coisa automaticamente e eu recebo um “relatório”: os samples de coral são muito provavelmente Quantum Leap Choirs, a guitarra é / não é sampleada, a música foi gravada em torno do ano X, a voz é de Y etc etc. O que muitas vezes resulta em algo muito frustrante: a “trilha” esporrenta, mal elaborada e claramente feita de qualquer jeito (ou muito rápido, ou muito barato) que Hans Zimmer (em geral um cara fantástico e, no mínimo, extremamente competente) “fez aí” para o Sherlock do Guy Ritchie.

Qual o problema da trilha de HZ em Sherlock? Não acrescenta nada. Já ouvi tudo aquilo antes. E não posso afirmar nada, mas apostaria que a “orquestra” é essencialmente uma biblioteca de samples da Quantum Leap.

Saí de “Up in the air” pensando no tal zeitgeist americano (uma semana e meia até escrever algo a respeito) mas muito entusiasmado com aquela trilha inovadora, gravada com um jeitão de anos 70, com outro tipo de reverb, outra dinâmica, um som de piano que não está mais “na moda” (gravação e produção musical são “moda” pura, mas acho que as pessoas não se dão conta, nem entendem que as coisas que não envelhecem em geral são aquelas que quebram a norma / moda de suas respectivas épocas) e as vozes gravadas sem a porcaria irritante do “afinêitor Tabajara”, mais conhecido como Auto Tune – inferno da música dos últimos 10 anos, culpa do ProTools que começou com essa coisa blábláblá.

Muito “modernamente”, enquanto minha esposa dirigia para casa, abri meu browser do iPhone e fui procurar “quem era”. Surpresa no.2: eu não conhecia metade dos nomes (não ouvi “todo mundo”, mas é difícil pacas aparecer com algo não-axé não-pagode não-evangélico não-samba que eu não saiba ao menos situar). Surpresa no.3, a outra metade era Crosby, Stills, Nash & Young, uma demo do Nash e Roy Buchanan. Mas como eu, grande fã do progressivo / eletrônico e dos anos 70 tinha perdido aquele grupo completamente anos 70 que tinha uma música instrumental fantástica?

Levei uns dias – pouco tempo, mas uns dias e tive que usar o Google para isso, é bem raro – para descobrir que o “grupo tipicamente anos 70” com a bateria eletrônica Roland, o Rhodes típico com tremolo, as cordas do Mellotron e o piano acústico com som de Pink Floyd chama-se “Charles Atlas” e… os caras são de agora-agora!

Não fiquei maluco: ouvindo a trilha sonora em casa, nas caixas de masterização, dá para ouvir que é mesmo uma bateria eletrônica vintage (consigo saber exatamente qual se comparar com meus samples vintage [CR76??], mas ainda não tive tempo, e parece ser um preset, só de sacanagem!), é mesmo um Rhodes com efeitos e é mesmo um Mellotron sampleado. E o cara que gravou o piano acústico sabia o que queria e sabia o que estava fazendo – faz ANOS que não ouço um piano com um som tão interessante, tão … “não 2000”. Pode ser eletrônico ou “computacional”, temos coisas fantásticas rodando em cima de modelagem acústica. Não importa, é bom, é ousado, é bem colocado.

Não tem Charles Atlas na Amazon!!, então tenho que comprar a “coisa comprimida” no iTunes. Acho ótimo pagar por música, mas por que não me vendem os arquivos sérios? Mp3 é lixo ultra-comprimido, AAC é lixo um pouco melhorado.   :o(

Hum? E o cara que canta com uma ambiência vintage, com um arranjo tipicamente Simon & Garfunkel, sonoridade idem, vocais sobrepostos, claramente usando um multitrack antigo? Este é o Sad Brad Smith, nome de blueseiro … É também contemporâneo, pode nunca ter sequer chegado perto de um multitrack de fita, o reverb pode ser um IR de Abbey Road (todos temos isso em nossas máquinas de produção, hoje) e o único CD dele parece ter sido lançado por ele mesmo em 2000 – a produção parece ser “antiga” porque provavelmente foi meio tosca. E provavelmente remasterizaram a música para o filme.

E o cara que só pode ser contemporâneo de Simon & Garfunkel e que canta “Goin’ Home” com slide guitar, lembrando muito o som e uma harmonia do “Atom Heart Mother”, clássico do Pink Floyd? Chama-se Dan Auerbach. Acabei de comprar “Keep it Hid” (but don’t hide the good stuff!),  Contemporâneo nosso, não deles.

Hum?

Eu vou resumir a coisa sem os detalhes técnicos: enquanto ouvimos o lixo do lixo reciclado que é essa música de DJ’s xem noxaum musical, a porcaria que virou “todo mundo igual” e que pode ser qualquer loira-fake-turbinada processada até a morte por pitch correction e outros algoritmos infames de estúdio …. ENQUANTO ISSO (no Palácio da Justiça) um mundo inteiro de coisas interessantes passa por nós e não estamos sabendo.

Ultraparabéns para todo mundo da equipe do filme que teve visão, ouvido e conhecimento para montar essa trilha tão especial – ela soa coerente, ela tem um sentido, as letras das músicas complementam ou ilustram as imagens e o clima acrescenta uma camada nova ao filme – algo que me deixou muitas vezes mais interessado do que as imagens, já que eu não gostei tanto assim de parte das imagens.

Quanto ao resto de nós, acho que temos que pensar sobre isso tudo. Sobre uma demo do Nash de 71 ser melhor do que 97,5% do que está acontecendo agora. Sobre Sad Brad Smith, Charles Atlas e Auerbach não estarem tocando em lugar algum, mas fazerem um sucesso enorme quando alguém tem a visão de colocá-los num filme de sucesso.

Sabe o que eu acho? Lady Gaga, Miley Cirus, Black Eyed Peas, DJ WTFCares – lembram daquela música dos Titãs chamada “Bichos Escrotos”?  Pois é. “A mensagem” continua valendo.

Então desligue o rádio, entre no iTunes e comece a explorar O Novo, mesmo que o novo, hoje, soe “vintage”.

E isso aqui ainda não terminou.  ~;0)

- - -

NT [*]: Outra hora explico por que quero parar de usar as 4 formas inúteis de “por/que[ê] em português, embora entenda muito bem [quão inúteis são] todas elas. Aproveito e explico também a regra não-imbecil para lembrar rapidamente e sem chance de erros quando se usa cada um.

Domingo
jan242010

Up in the Air – Amor sem Escalas

Só posso começar dizendo que poucas traduções de título fazem um mínimo de sentido aqui no Brasil. Recentemente, uma das melhores foi “Avatar”, traduzido como “Avatar” – e não, por exemplo, como “Os Seres Azuis da Floresta”, como (quase) seria de se esperar. Por que não colocaram logo “Demitindo Ryan”, já que amam repetir o que já usaram antes?

Queria muito dizer que gostaria que o título fosse parte do copyright e, contratualmente, não pudesse ser alterado a não ser que não tivesse solução possível, mas (a) isso não iria funcionar, porque sempre iam “dar um jeito” e (b) filmes são produtos e produtos recebem o rótulo que venda melhor em seus mercados de destino. Sentido? Que sentido? Não é uma comédia romântica, bolas, mas, conhecendo vagamente o funcionamento de pelo menos uma distribuidora grande instalada em SP, ninguém “vê” muitos os filmes, então, se tem o Clooney e ele tem uma relação vagamente romântica no filme, ótimo – passa a ser uma comédia romântica. E que se venda.

Não sei se tem “amor” no filme e “sem escalas” é uma forma estranha de fazer referência aos aviões que vão de lugar algum para lugar nenhum levando o Sr. Ryan Bingham – George Clooney – cuja profissão é demitir pessoas nas empresas ‘dos outros’. É um “demitidor terceirizado”, digamos assim.

Pergunta mais freqüente dos personagens demitidos por ele: “como você consegue dormir à noite?”. É sobre isso que eu gostaria de falar. As atuações, a fotografia, a direção blábláblá vocês podem procurar em outro lugar.

Só queria observar que fiquei fascinado pela criatividade, originalidade e belas gravações das músicas usadas no filme. Algumas dos anos 70, outras novas, mas com o bom som dos 70. (Maiores explicações a respeito em outro artigo.)

O roteiro ganhou um Globo de Ouro em 2010 e foi escrito por Jason Reitman (também diretor do filme) em parceria com Sheldon Turner. Reitman é diretor do brilhante “Thank You for Smoking” (2005) e de “Juno”, um filme de 2007 que fiz questão de não ver mas não lembro mais o porquê. Reitman parece ter um talento singular para captar um “espírito da época” (um zeitgeist, é mais bonito assim). Não é o filme que me incomoda, é o que Reitman capta & retransmite no filme.

Em “Obrigado por fumar” ele tinha deixado claro que vivemos (a América talvez viva mais que nós) uma época em que a ‘razão cínica’ é o que conta. O personagem principal teria sido, em tempos gregos, um grande Sofista, porque vivia de transformar os muitos “contras” do fumo em “prós” para o lobby da indústria. O que ele estava defendendo? Não importa. Importa que havia dinheiro circulando e, se a “informação quer ser livre” (mote dos cyberpunks e hackers dos anos 90 - “information wants to be free”), o dinheiro não precisa querer: ele compra sua liberdade.

O personagem de Clooney é similar e fala, de duas formas no mesmo filme, sobre esta razão cínica. Não questiona a lógica de “demitir” ou o que possa estar por trás disso, mas deixa muito seco, na tela, que “demitir” também é um “negócio” e que pode ser lucrativo. Tem um ‘monólogo’ ótimo do chefe de Ryan em que ele fala como, na crise americana, setores inteiros estavam “going down” (indo à falência, ou quase isso) e como aquela era a oportunidade de ouro para eles, “demitidores profissionais”.

Se alguém me perguntar como eu defino a ‘razão cínica’, é assim: a eficácia do pensamento prescinde de qualquer valor ético ou moral, contanto que traga lucros imediatos para aquele que elabora ou profere algo. (Podem citar, por favor!)

Reitman não se contenta com uma crítica, contudo. O personagem de Ryan tem como “valor” e “medidas” (de sucesso, de realização) quantas milhas viajou. Poderia ser dinheiro, mas não é: em um “Easy Rider” v.2010, o “road movie” ainda fala sobre não ter raízes e sobre viajar pela América, mas não é mais “em busca de…”, é “para longe de…”. As motocicletas se tornaram aviões impessoais, os hotéis são residências permanentemente temporárias, a mochila é uma mala de executivo otimizada e com rodinhas, e “as drogas” são, sei lá, o trabalho, o acúmulo (de milhas, de cartões, de dias fora de ‘casa’, do vazio) – algo assim.

Abelaira, em “O Triunfo da Morte” – romance, não ensaio, ou ensaio escrito como romance, como quiserem -, escreveu: “Ser é ser controlado. Em latim, mas já me esqueci. Ou então: X serve, logo existe". O mundo de Ryan é este universo em que “existir” é “servir”. Não no sentido “grandioso” de servir a uma Nação ou servir como portador de um ideal: não, só servir, no sentido que uma vassoura serve para limpar o chão. Ryan serve para tornar mais asséptico (de “assepsia”, não de “asceta”, de onde a zâmbia na grafia) o trabalho sujo que é demitir pessoas, ou seja: dizer a X que X não serve mais e, como X não serve, é freqüente X achar que não vai mais existir.

Entender que colocamos um preço e um valor para esta função – a de dizer que uma pessoa não serve mais – e que isso também tem que ser otimizado, visando uma maximização dos lucros (o trabalho de Ryan corre o risco de ser substituído por um “telemarketing da demissão”, mas isso é outro ensaio) … bom, esse é o grande soco no estômago do filme.

Deixa um sentimento ácido na saída, mas Reitman também sabe que vivemos novamente em tempos de “panis et circenses”, com mais ênfase no “circenses” do que no “panis”. Em outras palavras: o espetáculo é o que conta. Reitman tem a “sabedoria de mercado” – ou a razão cínica bem resolvida – de cobrir seus coquetéis ácidos com muito glacê, de forma que nem todos chegam à parte ácida. 

CDC

Domingo
jan172010

mais pessoas “vão” com Visa? GO. ? (mais marketing Xem Noxaum)

vi um daqueles anúncios que fazem ping no meu Radar Xem Noxaum. dizia algo como “mais pessoas vão com Visa”. trazia “go.” escrito no meio de um troço azul. “go.”, com esse ponto esquisitão. WTF?, pensei. e como é que as pessoas “vão com Visa”? WTF2?

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Quinta-feira
jan142010

Críticas, blogs "sobre tudo" e (ainda) traduções

Há muitos Doppelgängers pelo mundo. Um Doppel que também é tradutor perdeu as idas e vindas de posts sobre a tal crítica feroz “contra” O Livro de Jobs e mandou, mais tarde, um comentário sobre o qual comento aqui. Como você disse, ninguém sabe ou pode saber que _________, mas ainda assim todos se vêem no direito de criticar o que bem entendem, protegidos por essa distância segura e, por vezes, pelo anonimato que a internet proporciona.

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Terça-feira
jan122010

Avatar (uma crítica)

Meu Doppel predileto para assuntos de cinema me enviou por mail, hoje.

Vi ontem o Avatar: fiquei com a sensação de que o James Cameron está fazendo mais ou menos o mesmo filme desde o Exterminador 2, só que com cada vez mais dinheiro e tecnologia. É tudo feito para ser “mindblowing” e essa ostentação toda cansa um pouco — em algum momento “menos é mais” virou coisa do passado em toda a parte.

A estética da floresta em que vivem os seres azuis cujo nome já esqueci (não importa mesmo) é quase idêntica à Macalania Forest de Final Fantasy X, do Playstation 2, só que só eu percebo isso e não me impressiono — meio triste, fico sem ter com quem comentar. CGI e “realidade” de fato se mesclam organicamente e o vilão da vez é A Ganância da Humanidade (A Humanidade, aliás, são Os Americanos, que se arrogam em Hollywood o título de Espécie Humana) e tem uma metáfora chulé em relação à política externa “give me what I want or I’ll blow you to bits” dos EUA jogada em um diálogo aqui e acolá caso você seja burro demais para entender por conta própria.

Sempre acho engraçado como uma das mais poderosas ferramentas de manutenção do staus quo de dominação americana, o cinema americano, adore criticar essa mesma dominação de forma anódina — assim, eles mesmos se criticam e fica tudo elas por elas e tudo a lesma lerda. Acrescente-se uma historieta de amor interracial (interracial de verdade) e voilà, todos ficam satisfeitos, god bless America por eles nos darem filmes tão bem feitos, bem intencionados e simplesmente super bacanas em todos os sentidos.

A trilha sonora, por sinal, é óbvia em todos os momentos, desde as orquestrações grudentas das sequências “de vôo” até a world music meio Peter Gabriel meio Hakuna Matata das sequências dedicadas à “vida natural” dos bichos azuis. Ah, e o tão falado 3-D é só um trambolho que você coloca na cara para as sequências terem mais profundidade de campo — às vezes voa um treco qualquer para cima de você e é isso.

Oh, the humanity of it all.

(CDC: Onde eu teria dito: “The horror, the horror…”, mas talvez não me entendessem.)

Comentários dos prezados leitores?